domingo, 22 de novembro de 2009

DÍVIDA PÚBLICA: PORQUÊ DECLARAR MORATÓRIA

ENTREVISTA
DÍVIDA PÚBLICA: PORQUÊ DECLARAR MORATÓRIA
http://www.andes.org.br/Informandes19.12.06-pg2.htm
A dívida pública brasileira vem crescendo a cada ano e sufocando a possibilidade de investimentos nas áreas mais essenciais do país. Ano a ano assistimos aos sucessivos governos cortarem o que consideram gastos públicos, em detrimento do compromisso firmado com os credores das dívidas interna e externa. A situação é grave: 59,5% dos recursos previstos no orçamento 2007 são destinados ao refinanciamento, amortização e pagamento dos juros da dívida pública. São bilhões que deixarão de ser aplicados na melhoria da educação, saúde, habitação, saneamento, reforma agrária etc.

O sacrifício do pagamento dos juros, no entanto, tem sido em vão. Quanto mais pagamos a dívida, mais devemos. Em julho de 1994 devíamos R$ 62 bilhões. Atualmente, devemos R$ 1 trilhão.

O economista José Menezes Gomes, professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e 3º tesoureiro do ANDES-SN, fala sobre a origem da dívida pública, analisa os impactos da dívida para países pobres e ricos e alerta para a necessidade da suspensão do pagamento dos juros como uma mudança estrutural da política econômica.

- Qual foi a principal causa do crescimento monstruoso da dívida pública brasileira?
"Elevar as taxas de juros tornou nossos títulos públicos mais atraentes. Só que isso acionou o motor do endividamento. Devíamos R$ 62 bilhões em 1994. Hoje, devemos R$ 1 trilhão."

- Bom, o primeiro motivo foi a transformação da dívida externa privada em dívida interna do Estado, em 1980. Depois, veio o Plano Real com sua lógica de fortalecer a moeda sem mudar a estrutura da economia. O Brasil tinha uma moeda fraca, uma inflação alta e, de repente, sem muitas mudanças na estrutura da economia, transformou-a em moeda forte e passamos a ter inflação baixa. Foi uma verdadeira mágica que fez com que o Real chegasse a valer mais que o dólar. Essa “mágica” teve um preço, pois sua política central consistia em elevar a taxa de juros para atrair moeda estrangeira para formação de reservas cambiais. Com essas reservas cambiais o país manteve a paridade do Real, em compensação, a elevação dos juros resultou na elevação da dívida pública. E quando elevo a dívida pública tenho que aumentar ainda mais a taxa de juros, pois quando esse modelo desgastou houve risco de fuga de capital para outros países. Elevar as taxas de juros tornou nossos títulos públicos mais atraentes. Só que isso acionou o motor do endividamento. Devíamos R$ 62 bilhões em 1994. Hoje, devemos R$ 1 trilhão. O aumento da dívida aconteceu porque a política monetária brasileira e da maioria dos países da América Latina é a política monetária do rentista. A questão central é: nossa política monetária acaba transformando as funções fundamentais do Estado, que passa a não investir em infra-estrutura, saúde, educação – tudo aquilo que justifica a existência de um estado nacional. Na verdade, o Estado que temos hoje é voltado para atender aos interesses de uma política monetária que atende a três grupos essenciais da economia: banqueiros, grandes capitalistas que também compram títulos públicos e os fundos de pensão. É uma política de juros que serve apenas para transformar em algo altamente rentável os títulos públicos.

- Qual a origem dessa dívida?
"A trajetória do desenvolvimento capitalista recente mostra que quanto mais o Estado agiu no sentido de contornar as crises do capital, mais ampliou suas contradições e ficou vulnerável aos agentes privados"

- Se analisarmos a história do capitalismo veremos que a dívida pública foi um elemento fundamental no processo de acumulação primitiva. O estado tomava emprestado recursos do chamado capital usurário para criar infra-estrutura necessária ao desenvolvimento do capitalismo – fomentar empresas, criar condições de funcionamento dos mercados, conquistar mercados mais próximos etc. Ou seja, o estado se endividou muito já na origem do capitalismo. Mas ao contrário do que afirmam alguns, quanto mais o capitalismo se desenvolveu, mais necessária tornou-se a intervenção do Estado no sentido de assegurar as condições ideais da produção do capital. O Estado passou a criar cada vez mais políticas para conquistar mercados externos e passou a ser um grande consumidor através dos gastos militares etc. Quanto mais os capitalistas se desenvolveram e chegaram à fase monopolista, mais precisaram de dinheiro para desenvolver políticas de interesse do capital. E a dívida pública foi contraída não para resolver os problemas sociais, mas os problemas do capital. A década de setenta foi de grande crescimento econômico para o Brasil. Naquela fase o governo criou uma forma de endividamento através de incentivos fiscais, subsídios, créditos etc., liderou, facilitou, o desenvolvimento do capitalismo, o que não foi suficiente para resolver o problema fiscal do Estado. A trajetória do desenvolvimento capitalista recente mostra que quando mais o Estado agiu no sentido de contornar as crises do capital, mas ampliou suas contradições e ficou vulnerável aos agentes privados, ou seja, o Estado usa dinheiro público para ajudar o setor privado, depois, sua dívida pública se eleva e para rolar essa dívida eleva a taxa de juros para que o próprio setor privado compre os títulos públicos e continue rolando suas dívidas. Então, na verdade, a dívida pública é, principalmente, resultado da política de favorecimento ao setor privado.

- Dever não é uma exclusividade dos países pobres. Países ricos como os Estados Unidos têm dívidas bem maiores do que o Brasil. Por que, para nós, a dívida é tão mais nociva?
"O grande segredo não é o tamanho da dívida, mas a condição que eu tenho pra rolar essa dívida"

- O grande segredo não é o tamanho da dívida, mas a condição que eu tenho pra rolar essa dívida. Os Estados Unidos, que devem sete trilhões de dólares - quase 70% de seu PIB, têm a facilidade de se endividar na sua própria moeda, nós, não. Durante muito tempo nos endividamos com o chamado Overnight, de curtíssimo prazo e juros elevadíssimos. Depois, nos endividamos em variação cambial, em títulos indexados por taxas como Selic, a índices de preços, ou seja, vamos rolando a dívida pública e pagamos hoje a taxa básica de 13,25%. Nos Estados Unidos, essa taxa é de 4,50%. No Japão, 0,25%. Na União Européia, 3%; na Inglaterra, 4,75%. O problema não é só dever – o que já é bastante grave – mas dever rolando a dívida numa taxa de juros tão alta – a taxa de juros real mais alta do mundo! Hoje, com a inflação de 4%, a taxa real de juros chega a quase 10%. Esse rendimento real é mais elevado que vários investimentos do setor privado. Os Estados Unidos estão extremamente endividados, mas mesmo oferecendo uma taxa de juros muito baixa, muitos procuram seus títulos porque eles oferecem garantias, pois têm hegemonia política, econômica, e em todos os sentidos.

- O que é pior: a dívida interna ou a externa?

- Bom, a dívida externa normalmente deveria ser dívida privada, pois é a relação da nossa economia com outros países, e a dívida pública é uma dívida contraída pelo estado junto a investidores nacionais ou internacionais. Daí, dívida pública também pode ser dívida externa. Nos últimos anos o Brasil acabou se endividando em aproximadamente 40 bilhões de dólares. Foram emitidos títulos no mercado internacional e dessa forma você tem uma dívida pública que já é naturalmente dívida contraída no interior. O fundamental é que nesse momento a taxa de juros externa é muito mais baixa que a taxa de juros interna. O governo brasileiro, quando liquidou parte da dívida externa com taxa de juros a 4% ou 5% ao ano e contraiu dívida pública a 14%, transformou isso num grande fato de política governamental. Ou seja, a liquidação da dívida externa acabou sendo um acelerador da dívida interna.

- O que fazer para sair dessa situação?
"É primordial que se faça uma campanha esclarecendo para a população qual é a natureza, a magnitude e as implicações da dívida pública "

- É primordial que se faça uma campanha esclarecendo para a população qual é a natureza, a magnitude e as implicações da dívida. Normalmente, a grande imprensa não aborda os pontos essenciais da dívida. A outra coisa: é necessário que se construa uma solidariedade entre os trabalhadores não só do Brasil, mas em toda a América Latina, a exemplo do que aconteceu nos anos 80 - uma espécie de aliança dos países devedores para a elaboração de uma estratégia de ação conjunta para declaração de moratória. Não há mais como pagar a dívida pública. Se pegarmos os dados da Secretaria do Tesouro Nacional vamos ver que a dívida pública já foi paga várias vezes. Agora, não se pode fazer isso de forma isolada, é necessário que se construa um grande movimento para que os países possam propor não pagar a dívida pública e pagar a dívida social. Todo esse dinheiro que está sendo pago no Brasil, R$ 179 bilhões em 2006, deveria ser revertido para investimentos em saúde, educação, segurança, reforma agrária, habitação... ou seja, deveria ser utilizado para o estado brasileiro pagar a dívida social que contraiu, pois durante toda sua trajetória esse estado sempre agiu para atender às demandas privadas. Depois, deveríamos realizar uma conferência latino-americana para discutir quais são os impasses colocados pela dívida pública e quais são as bandeiras de luta que a classe trabalhadora deve ter como eixo para que cada governo pegue esse dinheiro da dívida pública e invista na resolução dos problemas sociais.

- Quais seriam as conseqüências da moratória para os brasileiros?
"Quem perderia com a suspensão do pagamento da dívida pública seriam os banqueiros e os fundos de pensão, que ganham fortunas"

- Se o ato de declarar a moratória for um ato de declarar a luta pelos interesses da maioria da população, dos 56 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza, e dos demais que também enfrentam dificuldades para viver, terá grande aceitação popular. Oitenta porcento dos brasileiros sequer têm conta bancária, ou seja, não ganham com os títulos públicos. Milhões de pessoas não têm a menor idéia de quais são as vantagens de pagar a dívida pública. Quem perderia com a suspensão do pagamento da dívida pública seriam os banqueiros e os fundos de pensão, que ganham fortunas. Os bancos tiveram lucros de mil por cento, e parte deles vêm dos títulos públicos, das tarifas altas etc. Mas os banqueiros e fundos de pensão não representam nem 1% da população brasileira. Os verdadeiros beneficiários da moratória seriam os 56 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza e outros que nunca tiveram suas demandas atendidas. A moratória indica uma mudança de eixo na política econômica. Imagina o Brasil ter dinheiro para investir mais nas universidades, na saúde e na Reforma agrária, ou seja, pagar sua imensa dívida social!

Governo anuncia nova etapa do "grande negócio"

REFORMA DA PREVIDÊNCIA
Governo anuncia nova etapa do "grande negócio"
http://www.andes.org.br/Informandes49_previdencia.htm
Por Elizângela Araújo
ANDES-SN

As alterações anunciadas pelo secretário da Previdência, Helmut Schwarzer, para a previdência dos servidores públicos federais, interessam basicamente aos fundos de pensão, banqueiros e outros rentistas. A análise é do economista José Menezes Gomes, professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão – UFMA e 3º tesoureiro do ANDES-SN.

De acordo com notícias veiculadas pela imprensa esta semana, o governo pretende enviar ao Congresso Nacional, até o final deste ano, um projeto de lei igualando as regras de aposentadorias e pensões dos funcionários públicos federais às que hoje vigoram para os trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT. Entre os pontos do projeto, segundo Schwarzer, estará a limitação do valor da aposentadoria a 10 salários mínimos. Quem pretendesse receber benefício acima desse teto teria que contratar um plano de previdência complementar.

As novas regras, segundo o secretário da Previdência Social, valerão para os servidores que ingressarem a partir de 2010 nos poderes Executivo, Judiciário, Legislativo e no Ministério Público, mas não para os militares. Estados e municípios deverão aderir às regras mais tarde.

Menezes explica que ao impor um teto para o valor da aposentadoria e forçar os servidores a pagarem planos de previdência complementar, o governo poderá enfraquecer o sistema público, como aconteceu no Chile e na Argentina, por exemplo. "Além disso, o dinheiro aplicado nos fundos de pensão é sujeito às flutações do mercado e dos rumos dos títulos públicos", completa.

Para o economista, a privatização do sistema previdenciário só interessa aos banqueiros, aos administradores dos fundos de pensão e outros rentistas, responsáveis por gerir as contribuições mensais dos trabalhadores. No Brasil, os fundos administram ativos da ordem de R$ 400 bilhões, ou seja, boa parte do PIB brasileiro, que é de R$ 2,5 trilhões. “Esse dinheiro está aplicado, em grande parte, em títulos públicos e ações, ou seja, os fundos se beneficiam do aumento da taxa de juros e boa parte dos gastos do governo com o pagamento desses juros é destinada a esses fundos, que são verdadeiros parasitas do dinheiro público”.

Os fundos de pensão participam da gestão de várias empresas e os seus representantes, que são trabalhadores, adotam a mesma lógica patronal de enxugamento das despesas e implementação da reestruturação produtiva. Para Menezes, esse é o grande problema da privatização da previdência, pois, para assegurar o complemento à aposentadoria, esses trabalhadores se aliam aos capitalistas e passam a conspirar contra os demais trabalhadores.

O sociólogo Edmundo Fernandes Dias, professor aposentado do Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de Campinas, explica que a reestruturação capitalista, como prefere chamar, requer reformas no Estado, que passa a ser gerido por critérios empresariais e não mais sociais.

Jà Menezes também lembra que o governo Lula destinou, em cinco anos, R$ 851 bilhões para o pagamento dos juros da dívida pública. “Dinheiro que deveria ser destinado à reposição das perdas salariais dos servidores públicos da era FHC/Lula, à reforma agrária, saúde, educação e segurança, ou seja, os serviços essenciais, cada vez mais caros e inacessíveis para uma grande parte dos brasileiros”.

Previdência é objeto de investidas do capital
No artigo Seguridade Social Brasileira: Desenvolvimento Histórico e Tendências Recentes*, a pesquisadora Ana Elizabete Mota, da Universidade Federal de Pernambuco, afirma lembra que "do ponto de vista histórico, a seguridade social é por definição esfera de disputas e negociações na ordem burguesa. Erigida no campo de luta dos trabalhadores, ela é sempre e continuamente objeto de investidas do capital no sentido de "adequá-la" aos seus interesses".

Mota lembra, também, que “a reforma da Previdência aprovada pelo Congresso Nacional no governo Lula dá prosseguimento à agenda de reformas iniciadas por Fernando Henrique Cardoso, consolidando o cumprimento das exigências dos organismos financeiros internacionais”. Nesse ponto, vale destacar que, logo após o Brasil ter obtido grau de investimento, no final de abril, a agência classificadora de risco Standard&Poors afirmou, conforme matéria do jornal O Estado de São Paulo (3/5/08), que o Brasil obteve a classificação em razão do aumento da confiança dos investidores na capacidade e disposição do governo de reduzir sua dívida. De acordo com a Standard&Poors, o Brasil precisa perseguir reformas econômicas que reduzam a relação entre a dívida pública e o PIB. A agência sugeriu que seja feita uma nova reforma da Previdência, "mais profunda em direção a outros tipos de composição de gastos governamentais".

Nesse contexto, os trabalhadores deverão se unir para lutar contra mais um ataque à previdência social. Menezes diz que quando as estatais federais foram privatizadas pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, na década de 90, o Estado arrecadou cerca de US$ 105 bilhões, o equivalente atual a cerca de R$ 180 bilhões. “Essa nova etapa da privatização da previdência resultará num volume de recursos muito maior do que a da privatização das estatais, e esse é o grande negócio que o governo Lula quer acertar. Como dizia Francisco de Oliveira, professor aposentado da PUC-SP, em entrevista à ADUSP por ocasião da PEC 40, pela qual o governo Lula iniciou a reforma da Previdência logo no início do seu primeiro mandato, “é preciso dizer a que vem essa reforma da Previdência: se trata de negócios, companheiros! E deixemos de mistificações ideológicas, trata-se de negócios.”

O economista da UFMA lembra que boa parte do R$ 1,3 bilhão pago a título de juros da dívida pública pelo governo brasileiro, nos últimos 12 anos, foi parar nas contas dos fundos de pensão. Ele diz que essa realidade não é a mesma de boa parte dos países, tanto desenvolvidos quanto em desenvolvimento.

Menezes critica, ainda, o fato de o governo incentivar os trabalhadores a contratarem planos de previdência complementar. “Há até desconto no Imposto de Renda para quem paga plano de aposentadoria privada. Temos um governo preocupado apenas com os interesses dos rentistas, e a CUT aprova essa reforma porque o setor majoritário dos fundos de pensão está dentro dessa Central”.

Para Menezes, os servidores públicos têm que lutar pela revogação da reforma da Previdência, que instituiu o fator previdenciário e a contribuição compulsória dos aposentados.

*Publicado na Revista do Fórum Nacional de Educação das Profissões na Área de Saúde - Fnepas

FGTS:Garantia ou insegurança

FGTS:Garantia ou insegurança
25/10/2000
JOSÉ MENEZES GOMES
http://www2.uol.com.br/tododia/ano2000/outubro/dia25/cidades.htm
Antes da criação do FGTS - Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - (lei 5.107 de 13/09/66), vigorava a lei que estabelecia garantia a estabilidade no emprego, quando o trabalhador atingisse dez anos na mesma empresa. Este fundo é constituído por uma contribuição compulsória por parte do empregador, equivalente a 8% da remuneração mensal do empregado. Sua finalidade era a formação de um pecúlio para os casos de aposentadoria, morte ou invalidez do trabalhador.
Por outro lado, para o capital surgiu a correção monetária para dar garantia efetiva aos ativos em relação a inflação, especialmente aos títulos da dívida pública.
Para garantir que este fundo fosse de mais longo prazo foram criados condições que condicionava o saque, da totalidade dos recursos, ao falecimento ou doença grave, pagamento de dívidas na aquisição de imóveis, aposentadoria, demissão sem justa causa, falência da empresa etc.
A insegurança no trabalho é um dos componentes do controle patronal. Ela esteve presente nos primórdios do capitalismo e assumiu várias formas no seu desenvolvimento, como também buscou-se criar mecanismos que a reduzisse. No entanto, no desenvolvimento capitalista ela é indispensável para manter um exército industrial de reserva.
No Brasil, nas últimas décadas, tivemos três momentos distintos de legislação. Até 1967 tínhamos estabilidade no emprego após 10 anos de trabalho na mesma empresa como marca do nacional-desenvolvimentismo. Daí até o governo FHC tivemos a introdução do FGTS como forma de “atenuar” os efeitos da demissão. Com FHC tem início as várias reformas que introduzem o trabalho temporário que minimizam o sentido não só do FGTS como também da previdência, visando diminuir os encargos e “gerar” mais emprego. Cada etapa representou um grau determinado de flexibilização.
Quando se perde a perspectiva histórica acaba-se por considerar, por exemplo, que o FGTS era uma conquista em relação ao trabalho temporário, mas na verdade era uma derrota em relação a estabilidade vigente anteriormente. Portanto, a retirada de direitos dos trabalhadores não é uma característica apenas do governo FHC. Este foi sim a fase mais intensa. Sua fase inicial se dá com o regime militar, quando começava a crise capitalista, hoje em fase acelerada, na preparação para uma nova etapa da acumulação e na inexistência de liberdade de organização sindical e política,.
Além da insegurança inerente a introdução do FGTS que facilitava demissões, outras surgiram em seguida. A primeira era como evitar a sonegação por parte de muitos patrões que burlavam esta obrigação. A segunda era como preservar o poder de compra deste fundo no momento de utilização pelo trabalhador e por último como estabelecer a gestão destes recursos de forma transparente.
Sobre a manutenção do poder de compra desse fundo, um estudo elaborado pela Subseção do Dieese na Federação Nacional das Associações do Pessoal da CEF (Fenae), mostrou que a correção monetária dos saldos das contas vinculadas dos trabalhadores foi incapaz de manter o valor real do dinheiro depositado pelo empregador em benefício futuro do empregado.
Deixando de lado a remuneração do FGTS (3% ao ano, em geral), se numa conta do trabalhador tivesse sido depositado R$ 100,00, em janeiro de 1967, sem haver saques desde então, em 10 de abril de 1997, o valor do depósito corresponderia a apenas R$ 16,78., ou seja, a inflação e os expurgos dos planos econômicos corroeram o saldo das contas do FGTS dos trabalhadores nos últimos trinta anos (Boletim Dieese maio/97).
Segundo o Dieese, isso foi possível porque os índices que corrigiam as contas vinculadas variaram quase sempre abaixo da inflação, exceção feita para os anos de 1971, 1981, 1982, 1986, 1995 e 1996. Esta correção abaixo da inflação, no entanto, revela que a introdução do FGTS não tinha como objetivo diminuir a insegurança no trabalho mas criar um fundo de financiamento de obras públicas (saneamento, habitação e infra-estrutura) com remuneração inferior as taxas de mercado, pois apesar deste fundo ter gestão tripartite, quem decide a remuneração e onde aplicar é o próprio governo.
Desta forma estes recursos acabaram sendo moeda de troca eleitoral para aqueles que apoiavam o governo, envolvendo diretamente os construtores e empreiteiros às custas do confisco dos trabalhadores. Assim, foi também base para muitas obras superfaturadas para financiamento de campanhas.
Depois de mais de dez anos tramitando na Justiça o pedido de reparação das perdas pelos expurgos dos planos Verão (jan/89) e Collor I (abril/90), finalmente o STF deu ganho de causa aos trabalhadores. Imediatamente veio o discurso de que o pagamento de quase R$ 40 bilhões iria ameaçar a “estabilidade da moeda” e as metas do FMI. Apesar do governo anunciar de forma eleitoreira, que os trabalhadores receberiam a correção independente de entrarem na justiça, as últimas iniciativas são no sentido de se jogar esta dívida para os precatórios para pagamento em dez anos. Assim, mais uma vez o FGTS tornou-se a fonte de insegurança e incertezas.
Esta tentativa de burlar direitos e atropelar decisões judiciais se deve ao fato que o dinheiro do tesouro nacional está direcionado para pagamento dos juros da dívida pública e externa ou para salvação de bancos como o Proer.
A crise capitalista, além de exigir uma maior insegurança no trabalho, requer também uma segurança para o capital com a transferência liquida de dinheiro público.
Porém, não podemos esquecer que para acabar com a insegurança do trabalho, em todos os sentidos, é necessário superar a classe dominante e a propriedade privada que fundamentam esta sociedade.

José Menezes Gomes é
professor da UFMA e Doutorando em História Econômica na USP

Acordo da Basiléia-outro caminho para privatização

Acordo da Basiléia-outro caminho para privatização por José Menezes Gomes
Local: Rio Branco - AC
Fonte: O Rio Branco - (19/09/2001)
Link: http://www.oriobranco.com.br/
José Menezes Gomes (Professor da UFMA e Doutorando USP) A criação do fórum de estabilidade financeira fez surgir um novo acordo de regras de capitalização da Basiléia. Pretende-se em tese, aumentar a garantia de depósitos dos bancos ao diminuírem a alavancagem (montante de cobertura dos empréstimos feitos, em relação ao volume de depósitos e patrimônio). O que poderia ser um pequeno passo no sentido contrário da desregulamentação financeira impulsionada no inicio dos anos 80, tem, com efeito, direto a aceleração na privatização da essência dos bancos estatais, já que não diferencia a característica dos bancos privados em relação aos estatais. O chamado PROER 2, com a liberação de R$ 12 bilhões do tesouro, inicialmente para o BB, CEF, BNB, faz parte destas exigências. Por trás disso está também a futura anistia de dívidas de grandes empresários, não podendo descartar iniciativa de privatização explicitas ou disfarçadas dessas instituições, pois o saneamento de estatais sempre foi o primeiro passo para sua privatização. Os bancos estatais serão prejudicados com esses novos parâmetros, já que realizam investimentos sociais (habitação, agricultura, infraestrutura, etc) e por esse motivo não operam na mesma lógica de rentabilidade e prazos de amortizações dos bancos privados. Quando a Caixa Econômica Federal financia a compra de um apartamento em 20 anos para pagar, assume investimentos de longo prazo, coisa que o setor privado não pratica. Nesse longo prazo muitas coisas podem ocorrer (mudanças na política monetária, desemprego, redução salarial). A medida que são forçados a adotar os novos procedimentos, estarão se distanciando daquela finalidade e risco. No Brasil, as exigências ficaram ainda mais rígidas que a do acordo, e a alavancagem máxima de 12,5 foi reduzida para apenas nove vezes o seu capital, com uma exigência de patrimônio líquido ajustado (PLA) em torno de 11% do total dos ativos. O banco do Brasil para se adequar àquelas exigências transferiria para o tesouro cerca de R$ 20 bilhões, sendo deste total R$ 5,2 bilhões em créditos rurais, de empréstimos acima de R$ 200 mil e R$7,2 bilhões referentes a títulos da dívida externa renegociada em 1994, que seriam transformados em dívida pública (FSP 27.06.01). O Banco do Brasil e Caixa irão se enquadrar nas regras da Basiléia para serem mais competitivos junto aos bancos privados, significando um redirecionamento mais ativo para a intermediação da dívida pública. Os dispêndios com o saneamento dos bancos estatais já consumiram R$ 60 bilhões, sendo R$ 52 bilhões com os estaduais e R$ 6 bilhões para cobrir parte da anistia da dívida dos ruralistas em 1996 pelo BB. A privatização dos bancos estaduais serviu, até agora, apenas para queimar arquivos da corrupção praticada por políticos e empresários próximos do poder, constituindo-se em apenas mais uma etapa de anistia de dívidas, já que nada foi feito para investigar quem foram os beneficiados. Parte dos problemas da CEF vem do fato desta ter assumido as chamadas partes podres dos bancos privados, durante o PROER, quando as carteiras de dívidas do sistema financeiro da habitação foram a ela repassadas. A criação da empresa gestora de ativos, pela CEF para administrar, R$ 27 bilhões de empréstimos habitacionais e saneamento, faz parte do ajuste patrimonial e pressupõe um plano de demissão voluntária e a contratação de trabalhadores flexibilizados. O processo de privatização mais claro pode ocorrer se o tesouro nacional não mais adquirir ações do BB, já que hoje 90% destas pertencem ao tesouro, ao BNDES e a PREVI. Isto abriria o caminho para a privatização disfarçada, pois irão recorrer às bolsas para negociarem seus papéis. Por sua vez, isso implicará na exigência deste banco se preparar para atender aos critérios de rentabilidade privada. Os rombos dos bancos estatais não podem ser atribuídos somente aos desvios vindos da corrupção, inerentes a gestão privada de seus empréstimos para atender aos grupos políticos de sustentação dos vários governos que tivemos. A gestão da política econômica e as demandas de financiamento das contas públicas e do setor externo, nos vários momentos de incertezas nacional e internacional, quando os agentes privados se negaram a financiar, são outras fontes de desajustes destas instituições. Já em 1976, quando o crédito externo encurtou e as taxas de juros externas subiram, foram esses bancos e as empresas estatais que se responsabilizaram pela captação de empréstimos externos para evitarem maiores constrangimentos externos. Nesse caso, o ônus foi muito grande e a seguir repassados para o tesouro. Em outros momentos, esses bancos foram usados para comprar títulos da dívida externa, como em 1995 durante a introdução do Real. Outra forma vem das conseqüências dos efeitos da própria política monetária, especialmente durante o plano real, quando os juros se elevaram para manter a estabilidade da moeda. Essa elevação das taxas possibilitou que Estados, municípios e União tivessem suas dívidas também elevadas. A caixa econômica, por ser a principal responsável pela gestão da política habitacional, também foi contaminada, a medida que os juros elevados exigiam uma maior remuneração para a poupança para atrair recursos. Isto por sua vez encarecia os recursos para investimentos no setor. O resultado desse processo é que o saldo devedor dos mutuários se elevou, implicando numa maior inadimplência e maior passivo a ser assumido pelo tesouro, que é o principal acionista. Segundo estudo sobre a evolução do crédito no Brasil de 1994 a 1999, de Ricardo Soares, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, o maior problema do novo acordo, vem do fato que os ativos recebem ponderações, nas quais as aplicações em títulos públicos são consideradas isentas de riscos, enquanto créditos e financiamentos chegam a ter ponderação de 100%, levando as instituições financeiras a ampliarem suas aplicações nesses títulos públicos em detrimento dos empréstimos ao setor privado, resultando na redução do crédito para pessoa jurídica (Estadão 24 07 01). Essas novas exigências do acordo, privilegiando os títulos públicos, abrem caminho para que os bancos estatais, que restaram, caminhem no mesmo rumo que o banco de la Nacion argentino, que passou a ser um dos principais compradores dos títulos públicos, num momento em que os banqueiros privados não aceitam comprar.

Assim, repetem o papel já desempenhado pelos bancos estatais. No acelerar da crise temos um novo paradoxo, quando o Estado se endivida com outro braço do Estado (bancos estatais), fato que no início do plano Real diziam combater. Por isso temos que reestatizar os bancos privatizados, mas ao mesmo tempo construir uma correlação de forças que represente os interesses dos trabalhadores, porque banco estatal não pode ser gerido pela burguesia. Antes disso, temos que quebrar o sigilo bancário, telefônico e fiscal de todos aqueles que participaram das várias gestões, juntamente com os beneficiários dos empréstimos.

Diretrizes orçamentárias da USP, um debate necessário

http://www.adusp.org.br/noticias/Informativo/128/inf12807.html
28/10/02
Diretrizes orçamentárias da USP, um debate necessário

No dia 17/12 serão votadas as diretrizes orçamentárias da USP para 2003. Como subsídio para as discussões do tema, publicamos abaixo a "Proposta de Debate sobre as Diretrizes Orçamentárias da USP", aprovada no VII Congresso dos Estudantes da USP, e apresentada por José Menezes Gomes, representante discente da pós-graduação na Comissão de Orçamento e Patrimônio (COP), na última reunião deste órgão, em 14/10.

O ponto central da proposta é a solicitação de que seja retirado das diretrizes orçamentárias de 2003 o item 3.1.2, "Adicional de Desempenho Acadêmico", que define critérios para a destinação de uma parcela de 20% da verba destinada a "Outros Custeios e Investimentos".

Esta última corresponde a 15% do orçamento total da USP (em números redondos, cerca de R$ 300 milhões, de um total de R$ 2 bilhões). Assim, o item 3.1.2 representa 3% do orçamento, o equivalente portanto a cerca de R$ 60 milhões.

As diretrizes atuais beneficiam as unidades que oferecem maior número de cursos pagos, contempladas com maiores recursos. A COP rejeitou a proposta, alegando considerar "mais adequada a diretriz adotada no exercício anterior", como informa na "Proposta Preliminar" aprovada em 14/10.

"Quando se discute o orçamento da USP estamos, é claro, discutindo uma concepção de universidade. Isso fica bem claro quando analisamos as diretrizes orçamentárias: nelas está a concepção de uma universidade voltada para o mercado, tendo nas fundações privadas e nos cursos pagos as vantagens para recebimento de verbas de parte do item ‘outros custeios e investimentos’. O caráter produtivista na determinação de parte desta verba é bem evidente", afirma Menezes.

A proposta

"Na distribuição de recursos no orçamento da USP temos 85% para pessoal e encargos e 15% para outros custeios e investimentos. Nossa intervenção neste momento refere-se somente aos 15% de outros custeios e investimentos. Os recursos de outros investimentos são alocados por meio de dotações específicas nos orçamento de cada Unidade e dotações de caráter geral.

As alocações específicas incluem a Dotação Básica complementada pelos adicionais de Desempenho Acadêmico, Manutenção predial, etc. A Dotação Básica (3.1) corresponde à parcela principal da rubrica Outros Custeios e Investimentos para cada Unidade. Ela é distribuída às Unidades com base nas atividades de ensino (por que não inclui pesquisa e extensão?) de graduação e de pós-graduação, ponderadas, respectivamente, 60% e 40%.

Já o item Adicional de Desempenho Acadêmico (3.1.2) corresponde a 20% da Dotação Básica Global que é distribuído entre as Unidades, adotando-se os seguintes indicadores e fatores de ponderação:

1. Em relação aos cursos de graduação – Fator de participação relativa = 15
2. Em relação aos Cursos de Pós-graduação – Fator de participação relativa = 20 , Fator de participação = 20
3. Produção científica da Unidade por Docente – Fator de participação = 10
4. Avaliação externa, representada pela participação relativa da Unidade nas concessões de agências financiadoras externas à USP – Fator de participação relativa = 10
5. Atividades de Extensão Universitária, representadas pela relação entre o número de cursos de Especialização, com peso 3; de Aperfeiçoamento, com peso 2; e de Difusão, Cultura e outros cursos de Extensão, com peso 1, ministrados por docentes da Unidade e o número de docentes da Unidade – Fator de participação relativa = 15 (no ano de 2001 este fator era 10 e foi elevado para 15, justamente porque favorecia as unidades que mais atuam com os cursos pagos, mais próximas da fundações.)

Questionamento

Considerando que 20% da dotação básica global acabam sendo alocados de acordo com Desempenho acadêmico, sendo que os critérios desta avaliação estão em questionamento (vide as alterações aprovadas recentemente no CO);

Considerando que este tipo de alocação pode representar uma forma de punição a unidades que apresentam características e problemas específicos, que longe de se buscar a solução, cria-se um círculo vicioso, onde a Unidade com menor avaliação receberá menos recursos, o que num momento seguinte poderá ampliar o problema existente (a FFLCH, por exemplo, considerando o problema enfrentado com a falta de professores, acaba requerendo tempo mais longo para a conclusão na graduação e pós-graduação, que, por sua vez, resulta em prejuízo no momento seguinte de liberação);

Considerando que entre os fatores de ponderação, as atividades de Extensão Universitária (item E) não só entram no cálculo como têm fator de ponderação relativa igual a 15, este fato privilegia Unidades que tiveram mais destaque na priorização desta finalidade e acaba por destinar mais recursos para as unidades que menos atuaram no ensino (é bom lembrar que extensão universitária na USP, hoje, é marcada pela realização de inúmeros cursos pagos, motivos de grandes polêmicas, inclusive decisão de Conselho de Pós-graduação de suspendê-los até que se estabeleça o que pós-graduação na USP);

Solicitamos nesta COP que seja retirado das diretrizes orçamentárias de 2003 o item 3.1.2, "Adicional de Desempenho Acadêmico", permitindo que estes 20% voltem para a Dotação Básica Global dentro dos critérios a ela inerente.

Esta solicitação se faz no entendimento de que o item 3.1.2 caracteriza-se atualmente como dotação por tarefa, parecido ao aplicado no governo Roseana Sarney, no Maranhão, onde as escolas públicas recebem verbas de acordo com princípios semelhantes aos praticadas na USP.

Tal princípio também está presente na remuneração por tarefa existente nas Universidades Federais."

Eleições 2002: Efeito Orloff ou saída operária camponesa?

JOSÉ MENEZES GOMES Anterior | Índice | Próxima

Eleições 2002: Efeito Orloff ou saída operária camponesa?
http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=59161&edicao=10003&anterior=1
O pacote anunciado por Domingo Cavallo, com a desvalorização disfarçada de 8% do peso e aprovação pelo congresso argentino da incorporação do Euro como referência para do Peso, além do dólar, marca o futuro fim da última âncora cambial dos países subdesenvolvidos. Isto ocorre após a renegociação de US$ 29,5 bilhões da dívida externa pública e uma recessão de mais de três anos.

No Brasil, impulsionado por outros motivos, o Dólar chegou a R$ 2,50, culminando não só com a elevação dos juros em 1,5% chegando a 18% ao ano, além de uma nova ida ao FMI, quando a anterior já estava se findando. Foram mais de US$ 10 bilhões destinados a evitar a crescente desvalorização, que no ano já tinha chegado a quase 30%. Isto, de certa forma, marca os limites do câmbio flutuante e retorna a vinculação entre a política monetária e o câmbio, que marcou a época da âncora. Lá temos a crise da âncora e aqui a crise do câmbio flutuante.

Se a queda da taxa de juros nos EUA e na Alemanha, no inicio dos anos 90 permitiu, entre os outros motivos, a introdução desses modelos pelas economias subdesenvolvidas, no momento atual temos uma nova etapa de queda acentuada nos juros básicos americanos, chegando a 3,75% ao ano, onde a vulnerabilidade externa, a crise energética e o chamado “risco país” (risco de não pagamento das dívidas), acabaram por contrapor o efeito da queda de juros nos EUA. Com a aceleração da crise capitalista e da crise financeira do Estados, especialmente os periféricos, os efeitos da queda dos juros foram diferentes. Se a economia brasileira tinha se recuperado relativamente no ano 2000, com taxa de crescimento de 4% e prometia o mesmo patamar para esse ano, o cenário que resultou está mais para recessão do que para retomada.

Na política interna surgiu nova determinante, não só pelos motivos acima, mas também por mais uma rodada de escândalos, onde tivemos a renúncia, para evitar a cassação de dois senadores e ameaça de investigação do Presidente do senado Jader Barbalho, no desvio de verba do Banpará. Estes fatos tendem a minimizar as possibilidades de eficácia eleitoral de FHC e do seu grupo na próxima eleição.

Na Argentina, temos a expansão do movimento de fechamento de estradas, greves gerais, vários escândalos, além da prisão domiciliar do ex-presidente Menem por envolvimento na venda ilegal de armas. Este é melancólico fim das alianças surgidas pelo continente, que deram sustentação política para a implementação das políticas do FMI e BIRD: denúncias, escândalos, assassinatos, etc). É também, início da crise política, tal como ocorreu no México, Argentina, Peru, Equador. O grande problema é saber o que vem a seguir.

Lá, já tivemos o início de um ciclo político, no continente, antes existente na Europa, com a eleição de Fernando de La Rua. Este ciclo é marcado, inicialmente pela eleição da direita, que privatiza e retira direitos dos trabalhadores, produzindo um desgaste político que em seguida permite a chegada da centro esquerda ao governo. Essa, por sua vez, dá continuidade e às vezes aprofunda as reformas, resultando em desgaste político junto aos trabalhadores, permitindo em seguida o retorno da direita clássica ao poder. Neste intervalo, a direita propriamente, terceiriza junto a centro esquerda a tarefa de manter suas políticas.

No Brasil, com o grande desgaste político do governo, a candidatura de Luis Inácio Lula da Silva, está em primeiro lugar disparado nas pesquisas.

Se num primeiro momento, poderia representar uma boa perspectiva aos trabalhadores, a medida que começa o debate sobre o programa de governo a ser adotado as preocupações também se elevam, pois entre os pontos centrais do programa estão. A manutenção da CPMF e uma possível independência do Banco Central, numa tentativa de busca de credibilidade juntos aos grandes banqueiros e os organismos financeiros internacionais (FMI e BIRD).

O editorial do jornal Folha de São Paulo, com título Oposição à Argentina de 12 06 01, já indicava um alinhamento entre PPS e PT a um gesto de boa vontade da oposição de centro esquerda direcionado a um certo consenso de mercado, que reduziria a possibilidade do eleitor poder optar entre projetos diferentes, já que tanto direita como esquerda estariam dentro dos pressupostos ortodoxos.

Segundo o jornal “o risco não é o Brasil aproximar-se do Reino Unido, onde se tornou mínima diferença entre trabalhismo e conservadorismo. O risco é da vida partidária aqui sofrer de mal semelhante ao que padece a da Argentina, onde já não se vê força política capaz de liderar a saída da crise provocada por um modelo de superdependência de capitais estrangeiros. Lá a oposição ao menemismo subiu ao poder. Mas ao aderir à tirania do mercado, tornou-se idêntica às forças que conduziram à crise”. O que o jornal não tocou foi na raiz do problema: a dívida externa e interna.

O endividamento externo e interno retomou a patamares maiores que nos anos 80, mas na atualidade é o principal ingrediente desta “submissão” de governos que se propõem apenas administrar a crise capitalista, ao contrário de impulsionarem políticas de transição visando a superação do capitalismo, justamente no momento de agudização de sua crise. A renegociação das dívidas, não resolve, pois a Argentina acabou de renegociar quase US$ 30 bilhões e em nada resolveu seus problemas econômicos e sociais, apenas jogou para frente um problema que poderia estourar agora.

A independência do Banco Central proposta pelo PT, que significaria manter Armínio Fraga, pode ser a medida de “choque de credibilidade” aos banqueiros, mas terá significado parecido ao do governo de la Rua, que reconduziu Domingos Cavallo ao ministério da economia com superpoderes. Isto representaria um verdadeiro golpe de Estado, pois quem iria definir o eixo da política monetária seria justamente alguém que se quer foi eleito, ou seja, quem mandaria é quem não foi eleito pela população, mas escolhido pela comunidade financeira, como garantia dos compromissos com o pagamento das dívidas. Esse fenômeno é a síntese das contradições vindas políticas exigidas pelo banco mundial e o FMI para garantirem a “estabilização monetária”. O apagão é a revelação do parasitismo da iniciativa privada e das limitações dos investimentos estatais e o redirecionamento das receitas governamentais, para pagamento de juros das dívidas. É, portanto, a explicitação do equivoco do banco mundial, que afirmava que o Estado deveria se afastar da atividade produtiva e dar lugar a iniciativa privada.

Com o câmbio flutuante e a desvalorização do Real, tivemos uma fonte de prejuízo, quando da remessa de lucro às matrizes, uma elevação da dívida das empresas que deviam em dólar e o encarecimento de matérias primas, sem representar um aumento das exportações.

É necessário romper com esse ciclo vicioso de poder. Para tanto, é

necessário colocar como centro debate a elaboração de um programa, pelos trabalhadores, que tenha como eixo o não pagamento das dívidas externa e interna e o compromisso de pagamento da dívida social, pois o choque de credibilidade tem que ser para os trabalhadores e não para os banqueiros. Ao contrário de continuar a cobrar a CPMF para ter mais R$ 18 bilhões, bastava não pagar as dívidas que teriam muito mais dinheiro, pois o destino da CPMF é justamente para pagar os juros. Alegar que não podemos romper com o capital estrangeiro porque ele é importante para o desenvolvimento é falso.

O que temos nos últimos anos é exatamente uma inversão do fluxo de capitais, onde cada vez mais mandamos mais dinheiro para o exterior do que recebemos. Além do mais, o capital externo quando vem é para ser aplicado na aquisição de estatais ou para investir nos títulos da dívida pública.



* JOÃO MENEZES GOMES é professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e doutorando pela USP.

E-mail: menezesgomes@uol.com.br

Dinâmica da Economia Mundial Contemporânea

http://www.scortecci.com.br/catalogo/imagens/livros/dinamicadaeconomiamundal_oc.jpg

Dinâmica da Economia Mundial Contemporânea
ISBN 85-7372-838-8
Economia - JS 3267
Formato 14 x 21 cm - 212 páginas
1ª Edição - Ano 2003
Dinâmica da Economia Mundial Contemporânea

A crise do mercado mundial encontra sua manifestação na saturação do próprio mercado, na inatividade do capital, na não-venda das mercadorias e na progressiva queda da taxa de lucro. O capital nasce para auto-valorizar-se, para criar mais-valia e, portanto, para obter lucros: face a uma excepcional dificuldade (limite do mercado), a produção como um todo entra em crise
(Osvaldo Coggiola e Francesco Schettino)

O General Dwight D. Eisenhower, em seu discurso de despedida para a nação como Presidente, lembrou seus compatriotas que os EUA emergiram dos conflitos nos quais estiveram envolvidos como a nação mais forte, mais influente e mais produtiva no mundo. Daí em diante, o poderio militar seria um elemento vital na manutenção da paz: Nossas armas devem ser poderosas, prontas para ação instantânea, de tal sorte que nenhum agressor potencial possa ser tentado a arriscar sua própria destruição. E assim foi feito.
(Edson Emanuel Simões, Eduardo B. F. Perillo e Jair Diniz Miguel)

Os olhos do mundo agora estão sobre a América – disse Zoellick, representante americano para o comércio exterior, na IIE, compreendendo ele também Estados Unidos por América. Mas qual é a opinião dos especialistas a propósito do colapso dos acordos de Bretton Woods? Não sabendo nem mesmo que coisa possa querer dizer crise de superprodução de longo prazo, ainda não resolvida, não relacionam 1970 com aquela crise e então vêem somente os efeitos : o curso dos câmbios semi-fixos de Bretton Woods não se adaptou ao sistema de mercados abertos dos capitais. Mas a causa?
(Gianfranco Pala)

As políticas de estabilização na América Latina, nos anos 90, resultaram da grande interferência dos EUA nos rumos dessas economias, na tentativa de contornar as contradições próprias do capitalismo na sua fase monopolista atual, tendo como eixo a busca do equilíbrio fiscal e a redução do tamanho do Estado.
(José Menezes Gomes)
Osvaldo Coggiola (ORG.)

Departamento de História (FFLCH) da USP
Programa de Pós-Graduação em História Econômica 2002

Bancos e governo são os pais do risco Brasil

Bancos e governo são os pais do risco Brasil
http://www.anovademocracia.com.br/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=1321
Enviado por José Menezes Gomes*
Mesmo o maior superávit primário da história do Brasil, ocorrido em maio, de R$ 8,9 bilhões, com acumulado de R$ 20
bilhões no ano não está servindo para conter o "risco Brasil". A origem desta incerteza vem evidentemente da própria
iniciativa privada, seja diretamente na gestão das empresas ou indiretamente na gestão governamental, já que a
política em curso nos últimos 8 anos, em especial, se orientou pelo atendimento do interesse privado, seja nacional ou
internacional (privatizações, abertura comercial, flexibilização dos direitos, etc). Entre os problemas de gestão privada,
destacaremos alguns.
As apostas feitas por bancos e fundos de investimento causaram perdas bilionárias no mercado financeiro. No
mercado futuro do chamado cupom cambial, o prejuízo pode chegar a US$ 1,7 bilhão, que adicionado às perdas de
outros setores fará o montante chegar a US$ 3 bilhões. É evidente que esse fato terá efeito sobre a rolagem da dívida
publica brasileira, mas trata-se de uma escolha privada. A crescente remessa de lucros e dividendos ao exterior das
empresas privadas, e o contínuo pagamento de juros e amortização da dívida externa, ajudaram no crescimento do défcit
em conta corrente. Somente em seis anos (1994-1999) o serviço da dívida externa, que inclui amortização de parte da
dívida e pagamento de juros, acumulou o volume de US$ 213 bilhões ou US$ 533 e, mesmo assim, a dívida pública
chegou a R$ 680 bilhões, ou 55% do PIB, 2m 2002. Parte desta dívida é privada, o restante é dívida externa pública,
em parte resultante da estatização da dívida externa privada ocorrida em 1979. A crise das empresas privatizadas é
cada vez mais evidente. O setor telefônico já apresenta o risco do "caladão", a medida que empresas como BCP,
Vésper, Embratel e Telemar já estão inadimplentes. O valor das ações destas já caiu em 50 % em relação ao momento
da privatização. A proposta das telefônicas é a elevação de tarifas, redução de impostos, e a permissão de realizarem
fusões. O setor ferroviário entrou em colapso total. O setor elétrico foi "vítima" de sua falta de investimento, que
provocou o apagão, e cada vez mais eleva suas tarifas e outras formas de subsídios indiretos. O setor siderúrgico, após
abocanhar grandes lucros, principalmente no caso da CSN, com a aquisição de títulos públicos com correção cambial,
começa a chegar numa situação crítica pela política protecionista americana, que restringiu o seu mercado no exterior,
alem do próprio desaquecimento da economia mundial, que já tinha diminuído a demanda.
A fusão entre risco soberano e risco privado vem do fato que parte da lucratividade das grandes empresas nacionais e
estrangeiras (receitas não operacionais) depende dos rumos dos títulos dos paises endividados. Alem disso, a definição
desse risco vem também da capacidade destas empresas honrarem seus compromissos com fornecedores, coisa que
a BCP e Embratel, etc, não estão cumprindo. Combater a inflação não foi suficiente para conter a eclosão da crise
capitalista. Ao contrário, o Estado, que já estava endividado em 94, no início do Plano Real (R$ 60 bilhões), ficou
ainda mais endividado (em 2002 deve (680 bilhões), comprometendo ainda mais a capacidade de financiamento do
Estado nas funções anticíclicas, alem de abandonar inteiramente o que se chama de "função social". Dizer que o Brasil
pode vir a ser a Argentina, como indicador de crise social, é falso porque o Brasil tem 53 milhões de trabalhadores
abaixo da linha da pobreza, enquanto aquele país tem 37 milhões, ou seja, o Brasil tem mais de uma Argentina
passando fome, já há muito tempo. A questão central é saber porque não estão nas ruas, mobilizados? Por outro
lado, a continuidade do pagamento da dívida externa não depende só do desejo do governante que for eleito, mas das
condições objetivas para tal (crescimento das reservas), fato cada vez mais distante, dado o volume de reservas
existentes e volume de dívidas que vencem nestes dois anos.
O que se chama de risco país evidentemente é o conjunto da política praticada nos últimos oito anos do governo, com
o apoio da base governista (PSDB, PMDB,PFL). Para alguns, a crise da Argentina é apenas resultado de erros de
condução na política monetária. No entanto, trata-se dos limites dos Estados capitalistas de contornarem os efeitos da
crise capitalista na sua dimensão atual e, principalmente, da imposição da política dos Estados imperialistas,
especialmente os EUA, que repassam os efeitos da sua política econômica para os Estados "periféricos".
O que temos no momento é o desdobramento da política de contenção de crise, nos anos 1980, dos EUA, que culminou
na crise da dívida externa, que aparentemente teria sido contornada pela renegociação do Plano Brady. Nos anos 90, o
que se chamou de neoliberalismo, nada mais foi que mais uma tentativa de se buscar uma saída para aquela crise,
repassando-a para a periferia (abertura comercial, privatizações, pagamento da dívida externa). No início deste século,
observamos o esgotamento desta tentativa de saída da crise e a própria agudização da crise. A nova resposta imperialista
é a aceleração do "unilateralismo", com o acirramento do protecionismo da economia americana, sendo este outra
causa do crescente défcit das contas correntes, e por sua vez da fragilidade externa. A aprovação da lei americana de
subsídio agrícola poderá apresentar no curto prazo efeito devastador sobre o setor agrícola voltado para o mercado
externo e, é claro, sobre o balanço de pagamentos. Os países mais desenvolvidos gastam quase US$ 400 bilhões por
A Nova Democracia
http://www.anovademocracia.com.br Fornecido por Joomla! Produzido em: 22 November, 2009, 07:42
ano em subsídios à agricultura.
O "unilateralismo" americano, agudizado pela administração Bush e sua lei agrícola ameaça até mesmo a "nova" divisão
internacional do trabalho dos anos 90 (industrializados x agrícolas), ou seja, não bastava a América Latina ter retornado
à divisão internacional dos anos 60, mas também esta está ameaçada, dado que o protecionismo americano chegou a
todos os setores de sua economia. Justamente os banqueiros, os que mais lucraram com a política de estabilização da
era FHC, agora utilizam como instrumento de chantagem o chamado "risco Brasil", para elevarem ainda mais os juros
na rolagem da dívida. No entanto, foram eles, através do poder de decisão que tem no FMI e Banco Mundial, que
definiram os rumos da política de estabilização encampada por FHC e sua base governista. No início do Plano Real
brigavam pela paternidade do plano, agora brigam para definir o pai do risco Brasil. Na verdade os pais do real são os
pais do risco Brasil, apesar de quererem dar a este uma condição de filho bastardo.

sábado, 21 de novembro de 2009

Fundos de pensão podem transformar trabalhadores em exploradores

Tuesday, February 17, 2009
Fundos de pensão podem transformar trabalhadores em exploradores
http://relicariominado.blogspot.com/2009/02/fundos-de-pensao-podem-transformar.html
Por Elizângela Araújo

ANDES-SN

José Menezes Gomes, professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), já alertava para a ecolosão da crise capita-lista desde meados de 2007. Em várias entrevistas concedidas ao ANDES-SN, ele destacou a necessidade de união da classe trabalhadora para se defender da intensificação da retirada de direitos que com a qual os patrões e os governos neoliberais fustigam os trabalhadores nas crises do capitalismo. Nessa entrevista, concedida durante o 28º Congresso, Menezes combate a expansão dos fundos de pensão, alertando os trabalhadores para a natureza maléfica da previdência complementar que o governo Lula propõe para os servidores. Acompanhe.

- Quais os danos que o surgimento dos fundos de pensão acarretam para a classe trabalhadora?

- Em linhas gerais, a quebra da solidariedade de classe, já que os interesses dos fundos são cada vez mais conflitantes com os demais trabalhadores e sua própria base. Os fundos de pensão aplicam o dinheiro dos trabalhadores em títulos da dívida pública e ações. Isso significa que o tra-balhador também passa a depender cada vez mais da alta de juros e da valorização de ações (aumento do grau da exploração da força de trabalho) para supostamente assegurar sua aposentadoria, portanto, passa a defender interesses semelhantes aos dos capitalistas.

O fato de a CUT ter apoiado a reforma da previdência e a proposta de previdência complementar para os servidores públicos, revela a grande participação que os trabalhadores com fundos de pensão têm dentro daquela central. E o maior dano que isso causa ao conjunto da classe trabalhadora é a destruição do público e ascensão do privado. Junto com isso vem a constituição de um novo segmento de rentistas formado com recursos dos próprios trabalhadores.

Ou seja, os capitalistas desejam ações cada vez mais rentáveis, taxas de juros cada vez mais altas e que o dinheiro público seja cada vez mais utilizado para essa finalidade. Aceitar a previdência complementar é aceitar que seu interesse para assegurar seu futuro seja o mesmo dos capitalistas. Isso cria um grande conflito, porque o trabalhador passa a ter a expectativa de um futuro melhor que dependerá da destruição dos direitos dos trabalhadores de hoje, de seus próprios companheiros. Na medida em que os trabalhadores se tornam parceiros dos grandes capitalistas, tornam-se, também, exploradores, já que participam do conselho de administração das empresas.

- Esse é o caso da Vale, por exemplo?

- Sim. Quem tem o controle acionário da ex-estatal é a Valepar, com 53% do capital votante da empresa. A Valepar foi constituída em 1997 com a participação do banqueiro Daniel Dantas, durante o processo de privatização, com os seguintes participantes: fundos de pensão do Banco do Brasil (Previ), da própria Vale (Valia), da Petrobrás (Petros) e também a Bradescopar e a Mitsui, que era um grupo japonês. Isso mostra que os fundos de pensão se associaram ao capital nacional e internacional. Então, os funcionários da Vale, por meio da Valia, são parceiros na gestão da empresa. São eles que, indiretamente, aumentam a jornada de trabalho, precarizam relações de trabalho, promovem demissões e arrocho salarial e provocam danos ambientais. Além disso, são co-responsáveis pela perseguição política a movimentos como o MST. Um exemplo disso foi o episódio no qual o presidente da empresa, Roger Agne lli, chamou o presidente do movimento, João Pedro Stédile, de bandido, durante entrevista à jornalista Miriam Leitão no ano passado. Só para lembrar, o Agnelli foi um dos participantes do consórcio que subavaliou a Vale em 1995, preparando seu edital de privatização como representante do Bradesco.

- A previdência privada é, realmente, uma garantia de aposentadoria complementar?

- Nos anos oitenta, quando o neolibera-lismo estava em expansão nos Estados Unidos e na Inglaterra, o discurso era de que esses fundos seriam totalmente seguros. Mas os exemplos que temos mostraram o contrário. A Argentina privatizou a previdência em 1995, o Chile, bem antes. A Inglaterra também privatizou. Todos esses modelos faliram. Nos Estados Unidos, perderam dois trilhões de dólares e a tendência é perder ainda mais. A responsabilidade de arrecadar e assegurar a todos os setores da classe trabalhadora, mesmo aqueles que têm uma renda menor, uma aposentadoria, ou uma renda mínima que ajude a população a sobreviver, deve ser do Estado.

- Qual a origem dessa insegurança?

- Exatamente dos mecanismos utilizados para assegurar que no futuro os tra-balhadores tenham recursos suficientes para complementar sua aposentadoria, ou seja, das aplicações em ações e títulos públicos. Recentemente, quando as ações despencaram no mundo inteiro, somente nos Estados Unidos, dois trilhões de dólares, que seriam usados para assegurar a aposentadoria no futuro, desapareceram. Na Argentina, em 2001, quando foi declarada a moratória da dívida pública, os fundos de pensão eram os maiores possuidores desses títulos. Durante a renegociação da dívida, o governo argentino ofereceu um deságio de 75% do valor de face daqueles títulos, o que representou uma grande perda de recursos para as aposentadorias futuras. Recentemente, com a nova crise, mais perdas foram registradas. Por último, houve a estatização da previdência privada argentina. No Brasil, os fundos de pensão já perderam apro ximadamente quarenta bilhões de reais durante a crise atual.

- Mesmo assim, setores do movimento sindical defendem a expansão dos fundos de pensão.

- A CUT e outras centrais governistas continuam a realizar seminários que defendem essa expansão. Ao mesmo tempo, a Conlutas combate justamente esse tipo de coisa, e tem entre suas resoluções a proposta de lutar pela anulação da última reforma da previdência, já que ela foi feita a partir do dinheiro do mensalão o que ficou bem claro na CPI, e ao mesmo tempo lutar pelo fortalecimento da previdência pública. Se o governo dá tanto dinheiro para pagar a dívida pública e para salvar capitalistas da crise, tem dinheiro suficiente para garantir a aposentadoria de todos os trabalhadores, fazer a reforma agrária e oferecer os serviços essenciais como saúde, educação, segurança etc.

- Além da luta pela previdência pública, a classe trabalhadora enfrenta perdas salariais de mais de uma década. Como vencer essa questão?

- A primeira coisa: a Conlutas deve realizar um grande estudo sobre as perdas salariais de todos os setores da classe trabalhadora ocorridas nos últimos 15 anos. É importante que saibamos qual foi, de fato, a inflação desse período e as perdas que provocou, para poder reivindicar uma justa reposição. Utilizando como exemplo o estudo que o ANDES-SN fez, sabemos que as perdas salariais para os docentes são brutais. Um professor Adjunto I com doutorado deveria estar recebendo um salário de 13,8 mil reais, mas recebe, aproxidamente, 6,8 mil reais. Parte dessas perdas se deve à desindexação salarial introduzida pelo governo FHC, que também pôs fim à política salarial, além das várias tentativas de combate ao movimento sindical. Enquanto isso, todos os demais preços foram indexados (corrigidos) nã o por um índice de inflação qualquer, mas pelo Índice Geral de Preços - IGP-m, bem mais elevado que os demais índices. Com isso, os salários subiram cada vez menos, enquanto os preços dos serviços públicos privatizados aumentaram cada vez mais. Isso reduziu o poder de compra dos trabalhadores.

A segunda coisa: além desse estudo, é necessário que a Conlutas também promova uma grande mobilização pela retomada da política salarial, evitando que novas perdas ocorram. Ou seja, temos que lutar para zerar as perdas anteriores e evitar que novas ocorram, consolidando a solidariedade da classe trabalhadora. A questão salarial tem que ser tratada com uma perspectiva de classe. Nesse sentido, o ANDES-SN está no caminho certo o aprovar como um ponto central de sua luta a continuidade da organização da classe trabalhadora na Conlutas.

Corrupção e capitalismo

Corrupção e capitalismo
17/09/2000
http://jornal.valeparaibano.com.br/2000/09/17/pag02/artigao.html
José Menezes Gomes

O episódio do desvio de verbas na construção da sede do Tribunal Regional do Trabalho (SP) e o envolvimento direto de ministros e do próprio presidente foi classificado como a mais grave crise, não tendo paralelo no histórico dos abalos políticos na era FHC.É claro que este não é o maior valor desviado. Já tivemos a anistia à bancada ruralista de R$ 7,5 bilhões, Proer (R$ 30 bilhões), subsídios às montadoras, compra de votos na reeleição, empréstimos do BNDES para comprar as estatais, superfaturamento na compra de terras para desapropriação, etc.

O que dá a gravidade não é o montante, mas a revelação da intimidade do presidente através da sua assinatura no pedido de liberação de verba. Este fato serve para indicar sua participação direta nos outros episódios já conhecidos. As mais de cem ligações entre o ex-secretário geral da presidência Eduardo Jorge (ex-tesoureiro de campanha) e o ex-presidente do TRT-SP não se tratavam apenas da liberação de verbas e possível financiamento de campanha, mas também da interferência direta no salário dos trabalhadores quando da nomeação de juizes classistas comprometidos com o não reajuste de salários.

Eduardo Jorge afirmou que as "entranhas do poder nunca são bonitas quando são expostas". Destas entranhas ele entende porque sua cadeira no Planalto ficava a poucos metros da do presidente. Tinha contato direto e sabia das principais informações e ao mesmo tempo possuía cinco empresas (a maioria ligada a lobby), ou seja, era a parte estatal dos traficantes de influência.

Se no início da fase democratizante, tivemos o financiamento de várias candidaturas de direita patrocinadas pela CIA, através dos vários órgãos por ela criados, em seguida criou-se formas internas de financia-las através da corrupção e para tanto surgiram os vários PCs e Nicolaus dos quais FHC é herdeiro.

Outro aspecto perverso da corrupção generalizada na América Latina, é que por traz da expropriação da riqueza do Estado, está a saída de capitais da atividade produtiva interna e em seguida a fuga para os paraísos fiscais.

Este dinheiro a seguir se junta no sistema monetário internacional com o dinheiro do narcotráfico e do restante do crime organizado na forma de capital de curto prazo, que após etapas intermediarias de lavagem, acabam retornando ao país pelos juros altos praticados para manter a moeda.

A promiscuidade entre interesse privado e público, mesmo sendo uma marca do Estado burguês, passa a se acelerar com a crise da própria iniciativa privada e por sua vez do capitalismo. Este verdadeiro estupro dos cofres públicos e do interesse social cometido pelos últimos governos com destaque para FHC, está ligado a crise do capital, ou seja, o chamado Neoliberalismo nada mais é que a manifestação da crise do capitalismo nesta fase atual do capitalismo parasitário rentista submetidos ao BIRD e FMI. Esta saída exigia por sua vez, uma grande mudança na ordem jurídica.

Dai encontramos dois tipos de corrupção a formal, que resulta da própria política econômica implementada, na introdução do plano real (o símbolo da estabilidade) que contribuiu para a eleição e reeleição do Presidente e da maioria do Legislativo atual, bem como dos vários elementos da política do governo legalizando a transferência do dinheiro público para as mãos privadas. E a informal, que se manifesta no superfaturamento de bens e serviços adquiridos pelos vários governos e no próprio gerenciamento paralelo do orçamento.

Para acabar com a impunidade e dado o caráter limitado das CPIs, como as várias já demonstraram, é necessário construirmos mobilizações que resultem na constituição de tribunais populares.

Assim, poderemos revelar as várias maneiras utilizadas para saquear os cofres públicos e principalmente mostrar que os mesmos que exploram a mais valia diretamente são também os corruptores do Estado e em seguida julgá-los fora dos marcos burgueses. O combate a corrupção sem ter a perspectiva de superação da classe que a pratica e se favorece, acaba por elevar ao poder governos neopopulistas, que longe eliminá-la dão apenas novas formas.
José Menezes Gomes é professor de economia da UFMA e doutorando em história econômica da USP
Vale do Paraíba, domingo, 17 de setembro de 2000

Crise das bolsas poderá resultar em mais precarização e arrocho salarial

Título: Crise das bolsas poderá resultar em mais precarização e arrocho salarial
Data: 12/9/2007
Fonte: ANDES-SN - Informandes Online 25



Crise das bolsas poderá resultar em mais precarização e arrocho salarial

Elizângela Araújo
ANDES-SN

A “bolha imobiliária” que ameaça a economia dos Estados Unidos não é um fenômeno novo, e sim algo recorrente na história do capitalismo. A afirmação é de José Menezes Gomes, professor de Economia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e 3º Tesoureiro do ANDES-SN. Para ele, as conseqüências desse preâmbulo de crise, como chama, são claras para a classe trabalhadora brasileira: mais precarização dos serviços públicos e mais arrocho salarial, pois o governo, novamente, deixará de investir no social para salvar os grandes investidores.


- Qual a origem da crise econômica que os Estados Unidos vivem no momento e que ameaça outros países?

- Bom, o que está acontecendo hoje é algo que já aconteceu em vários momentos. Em 1929 tivemos uma crise que levou à Grande Depressão dos anos 30. Em 1987 tivemos outra grande crise, na qual se perdeu quase US$ 2 trilhões. E de 2000 a 2002, outra crise, não qual se perdeu quase US$ 15 bilhões. Essa penúltima crise foi chamada de “bolha da Internet”, a crise da "nova economia". Ou seja, esse preâmbulo de crise é algo recorrente na história do capitalismo contemporâneo. Por outro lado, o dólar atingiu o seu menor nível em 15 anos em relação às demais principais moedas, enquanto os Estados Unidos enfrentam um crescente déficit público e um déficit externo.


- Até onde se pode afirmar que a crise nas bolsas norte-americanas é causa da inadimplência no setor imobiliário?

- Atribuir a responsabilidade da crise das bolsas dos Estados Unidos apenas à bolha especulativa imobiliária é uma falácia. A crise das bolsas apenas reflete a crise superprodução na economia mundial e a expansão do volume de capital fictício, ou seja, reflete algo que está ruim na realidade da economia. O que temos hoje? As bolsas brasileiras renderam 302% nos últimos cinco anos. Nenhuma atividade produtiva, nenhuma empresa brasileira, consegue efetivamente gerar um lucro efetivo de 302%. A taxa média de lucro que o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) cobra de uma empresa, quando empresta dinheiro, é que ela consiga 12% por ano - essa é a média histórica.


- Como isso acontece?

- Quem, inicialmente, contribuiu para a explicação desse fenômeno foi Karl Marx, quando construiu o conceito de capital fictício, que é justamente essa modalidade de valorização em que se dissocia o capital real. Atualmente, há US$ 144 trilhões aplicados em ativos financeiros em todo o mundo, isso representa três vezes mais que a riqueza efetivamente existente, ou seja, o PIB (Produto Interno Bruto) mundial. Esse fenômeno foi um dos pontos da análise de conjuntura do 26º Congresso do ANDES-SN (Campina Grande-PB, 27 de fevereiro a 4 de março de 2007), e esse dado apresentado pelo próprio setor financeiro sinaliza o grau fictício de valorização que parte da riqueza capitalista acaba assumindo, ou seja, está dissociada da riqueza realmente existente. Quando você compra títulos, especula que no final do ano eles oferecerão uma determinada porcentagem de rentabilidade. Quando você compra uma ação, especula que no final do ano a estimativa de lucro seja cumprida. O que acontece? Quando ocorre a crise - a crise é justamente o momento em que se procura corrigir a diferença entre a riqueza nova efetivamente extraída e a riqueza fictícia, que é a expectativa que parte dos investidores criam e que acabam alimentando como se fosse uma corrente.


- Como essa bolha especulativa se reconstruiu?

- Para entender isso, é necessário entender a crise que ocorreu entre 2000 e 2002. Eu diria que o que os bancos centrais estão fazendo neste momento é tentando resolver o problema das bolsas acentuando ainda mais suas causas. É como se tentassem apagar um incêndio com gasolina. Há vários problemas que acentuam ainda mais as contradições do capitalismo. O principal deles é que a crise ocorrida entre 2000 a 2002 provocou uma recessão. Para combatê-la, os Estados Unidos baixaram sistematicamente a taxa de juros, isso facilitou o crédito, no mundo inteiro. Você podia pegar um dinheiro emprestado nos Estados Unidos com juros de 3% e emprestar, em outro país, a um juro de 8%, por exemplo. Isso criou um efeito que tendia a minimizar a crise de imediato, mas, na verdade, aumenta mais ainda o volume de pessoas que devem, gerando uma crise de crédito. Muita gente passou a tomar dinheiro emprestado e aplicar nas bolsas. Muita gente passou a comprar casas financiadas nos Estados Unidos. Muitos pegaram suas hipotecas para garantir o pagamento de novos empréstimos. Isso, nos Estados Unidos, formou uma bolha que chega a dez trilhões de dólares. Ou seja, a bolha especulativa nos Estados Unidos é praticamente do tamanho do seu PIB. Uma das causas desse grande problema foi a taxa básica de juros dos EUA ter chegado a 1% em 2003, mais baixa do que nos anos 30, durante a Grande Depressão. Isso criou uma facilidade de crédito que permitiu a mais gente consumir mais, sem que tenha aumentado o nível de renda. Ou seja, criou-se um mercado consumidor simplesmente baseado na capacidade de comprometer a renda futura dos consumidores. O crédito pode amenizar uma crise, mas em seguida suas contradições ficam ainda mais amplificas.


- E, claro, esse mercado acaba não se sustentando.

- O que estamos vendo é exatamente que tudo aquilo que foi utilizado para conter a crise das bolsas entre 2000 e 2002, na verdade, está alimentando uma nova etapa de crise. E o problema principal é que nesse processo vai surgir - e já está começando a se manifestar - uma crise bancária. Toda vez que há uma crise bancária, os bancos centrais entram pra salvar os bancos, os fundos de investimentos, os agentes privados que durante a especulação ganharam fortunas. Mesmo sendo absurdo, pode acontecer novamente no Brasil. É um sistema que supostamente se baseia na livre iniciativa, ou na liberdade de investimento, mas que na hora em que as contradições se aprofundam, o Estado intervém para evitar que haja uma crise bancária. Nos anos 80, aconteceu algo semelhante e uma grande parte dos bancos teve suas dívidas praticamente estatizadas, ou securitizadas nos EUA.


- Quais as possíveis conseqüências dessa crise para o Brasil?

- Se essa crise se expandir, pode haver uma brusca elevação da taxa de juros e haverá uma fuga massiva de aplicadores em todas as partes do mundo. Grande parte da especulação nas bolsas da América Latina se deve ao fato de que os títulos públicos nos Estados Unidos rendiam pouco. Então, como os rendimentos lá estavam baixos, os especuladores correram para a América Latina. Ou seja, a bolsa brasileira teve valorização de 302% em cinco anos, no entanto, a economia brasileira não cresceu. Esse indicador é muito interessante, pois é um tipo de valorização que não gera mais emprego, ou empregos na proporção necessária, não gera mais salários e nem impostos, porque esse capital fictício tem isenção tributária.


- E para onde vai esse dinheiro?

- Especialmente para todos os que compram as ações: fundos de pensão, bancos, todos os grandes capitalistas. Ou seja, as bolsas acabam servindo para que grandes agentes se apropriem da mais-valia gerada em cada empresa. O problema disso é que esse processo não estimula a economia brasileira ou da América Latina. O mais grave é que essa valorização artificial das bolsas está levando empresas do setor da educação a abrir seu capital, ou seja, venderem suas ações nas bolsas, como outra forma de valorização do setor educacional. Evidentemente, isso vai exigir ainda mais arrocho salarial e precarização do trabalho. E o mais terrível é que esse excesso de dinheiro provocado no mundo inteiro, especialmente em função da baixa taxa de juros nos Estados Unidos, provocou uma valorização artificial das bolsas em todo o globo.


- Você falou que o Banco Central do Brasil certamente vai socorrer, novamente, os bancos. Quais as conseqüências disso para os servidores públicos e a classe trabalhadora em geral?
- Bom, vamos pegar casos de países desenvolvidos - Estados Unidos, União Européia e Japão. Quando essa crise se manifestou, recentemente, e os bancos privados não estavam conseguindo honrar seus compromissos, os bancos centrais desses países liberaram US$ 350 bilhões para que eles conseguissem manter suas movimentações. Isso significa dinheiro público socorrendo capital privado, usado arriscadamente, pois será um dinheiro a mais que poderá não ser pago. No brasil, o dinheiro que será gasto pelo governo com a elevação da dívida pública, em função desta crise seria um dinheiro que poderia ser investido na saúde e na educação pública, por exemplo. Assim, o mesmo Estado que diz que não tem dinheiro para financiar a área social e tenta privatizar a educação, agora poderá socorrer os grandes especuladores que obtiveram 302% de lucros nos últimos cinco anos. Para se ter uma idéia, a Bovespa (Bolsa de valores de São Paulo) perdeu, no mês passado, antes dessa nova elevação, US$ 273 . Isso significa que houve uma queima de parte do capital fictício, mas à medida que os bancos centrais deram mais dinheiro para os bancos, ou seja, mais gasolina para o incêndio, voltou novamente a acelerar o processo de especulação. A crise das bolsas pode afetar a população de duas formas: primeira, se ela se prolongará, vai haver uma fuga de capitais e o governo vai elevar a taxa básica de juros, e fazendo isso vai elevar o endividamento público e o endividamento das famílias; segunda, é que o governo diminuirá ainda mais os gastos sociais, pois aplicará o dinheiro que deveria ser investido nesse setor para dar a quem não precisa, ou seja, aos especuladores.


- Isso quer dizer que o governo vai assumir a dívida?

- Isso aconteceu nos anos 80, quando os Estados Unidos elevaram a taxa básica de juros para 21% e os empréstimos externos eram contraídos com taxa de juros flutuante, quando a taxa do Banco Central dos Estados Unidos - a Prime Rate - se elevou, a Libor, de Londes, também se elevou. Com a subida da Libor, a dívida externa brasileira decolou. Os agentes privados nacionais não tinham como bancar seus compromissos externos, então, o governo assumiu essa dívida. Parte da dívida pública brasileira é conseqüência disso. Essa é uma operação recorrente: o Estado se ausenta de sua função social para atender justamente àqueles que mais se beneficiam com a previdência privada, planos de saúde etc., ou seja, com os agentes privados que mais ganham com a mercantilização dos serviços públicos, mas que também investem no mercado financeiro, que quando entra em colapso é salvo pelo Estado.


- Quais são as conseqüências dessa crise para a economia brasileira e a partir de quando poderemos senti-las?

- Em primeiro lugar, uma grande parte das aplicações na Bolsa de Valores de São Paulo [Bovespa] não é feita por brasileiros, mas, principalmente, pelos fundos de pensão dos Estados Unidos. Se essas ações tiverem uma queda brusca, como aconteceu entre 2000 e 2002 – naquela época, os fundos de pensão dos Estados Unidos perderam mais de 500 bilhões de dólares. No Brasil, foram perdidos mais de 100 bilhões de reais – a primeira coisa que acontecera é que quem depende dessas aplicações para garantir sua aposentadoria estará correndo sério risco de não ter seu futuro garantido. Outra conseqüência é a que já venho ressaltando, que é o governo diminuir os investimentos sociais para salvar os grandes investidores, inclusive esses fundos de pensão, o que significa mais precarização dos serviços públicos de saúde, educação etc. Os servidores públicos, que já estão ameaçados de ficar sem reajuste até 2016, por causa do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, terão que enfrentar essa precarização que afetará diretamente sua atividade. Para o restante da classe trabalhadora, que tem no serviço público sua única forma de ser atendida na saúde, na educação e em outros serviços, e que já é explorada, haverá ainda mais sucateamento dos setores da saúde, educação etc. Ou seja, a classe trabalhadora perderá duas vezes, porque vai aumentar o grau de exploração sobre ela, e porque o Estado, para tentar salvar os agentes privados que especularam, vai retirar dinheiro do social para o privado. Por isso, temos de combater a proposta do governo Lula da Silva de regulamentar a previdência complementar e a instituição dos fundos de pensão para os novos professores e demais servidores públicos. Isso significaria a redução da contribuição para a previdência pública e ao mesmo tempo torna-os potenciais vítimas das especulações do mercado de ações.


Fonte: ANDES-SN - Informandes Online 25

Guerra das cervejas

Guerra das cervejas
19/07/2000
http://www2.uol.com.br/tododia/ano2000/julho/dia19/cidades.htm
JOSÉ MENEZES GOMES

A onda de fusões capitalistas teve nos anos 90 um instante de expansão sem igual. A economia brasileira não ficou de fora. O mais recente episódio foi o da constituição da Ambev. Sobre este fato o editorial de um grande jornal burguês, na defesa de uma intervenção do governo que estabelecesse a concorrência, afirmou que “nunca tanto dinheiro foi gasto em jornais, revistas e televisões do Brasil para espalhar tanta desinformação. Os petardos da Kaiser, eventualmente ameaçada pelo novo gigante, e da Ambev, supostamente prejudicada por uma eventual restrição à fusão, espalharam chumbo grosso. Ideais nacionalistas exóticos, promessas impossíveis, ambições transnacionais duvidosas, ofensas, acusações e suspeitas de corrupção explodiram de todos os lados (...) Harpas e ética não fazem parte da lógica do mercado global: o lucro é sua mola, e esse é o papel básico do setor privado”.(“O Estado de S. Paulo” 11/03/)
Segundo este mesmo jornal, o ministro do Desenvolvimento, Alcides Tápias, decidiu intermediar um acordo entre as cervejarias Kaiser e Ambev, por sugestão do PT. Ele foi procurado pelos petistas Paulo Delgado (MG) e Antônio Palocci (SP), preocupados com a repercussão da fusão no nível de emprego no setor. A opção pela fusão, segundo o também petista Aloysio Mercadante, deve-se à preocupação com a situação financeira da Antártica (em setembro de 99 a Antártica teve prejuízo líquido de R$ 226 milhões) e as perspectivas de conquista de mercado externo para o guaraná brasileiro, que a Ambev viabilizaria.
Tivemos, também, a promessa exótica, para compensar o impacto negativo no mercado e na imagem Ambev, de garantir financiamento por parte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para que os funcionários de pequenas fábricas, que seriam desativadas, pudessem assumir seu controle na forma de cooperativas.
A concentração vinda desta fusão no mercado de cerveja já é regra no mundo: na Argentina, a Quilmes vende sozinha 76%; no México, a Fenza e a Modelo detêm juntas 100%; na África do Sul, a SAB domina 98%; no Chile, a CCV fica com 89%; e no EUA, a Budweiser e a Miller dominam 76% do maior mercado de cerveja do mundo.
Esta tão falada “guerra das cervejas”, na verdade encobriu a “guerra” contra os trabalhadores das empresas concorrentes nacionais e a futura guerra contra os trabalhadores das demais cervejarias latino-americanas. Primeiro, perdem porque a arma encontrada para vencer o concorrente é exatamente efetivar uma reestruturação da produção, de modo a reduzir os gastos com salários, o que leva tanto ao desemprego como a retirada de direitos e precarização do trabalho.
Segundo o presidente da Kaiser, “entre 1989 e 1998, a Brahma reduziu o número de empregados de 25 mil para 11 mil, o de distribuidores, de 957 para 358, o de fábricas, de 36 para 29, e, em compensação, aumentou seu lucro líquido de US$ 36 milhões para US$ 272 milhões” (Idem 10/02/).
Em segundo lugar, os trabalhadores perdem na condição de consumidores, porque estas fusões formam monopólios mais poderosos que passam a estabelecer novos patamares de preços. Trata-se de preços de monopólio ou “preços políticos” porque estabelecem independente do preço de produção (preço de custo mais a taxa média de lucro).
Os passos para isso já foram dados. Logo após a aprovação da fusão, os preços da Ambev foram reduzidos em 5% para exatamente quebrar os concorrentes e em seguida estabelecer o preço que atenda a margem de acumulação por eles planejados para atender aos acionistas.
Marcel Telles, presidente da Ambev, explica porque a nova companhia precisa concentrar recursos: “Precisamos de fluxo de caixa porque nossa estratégia envolve a compra de cervejarias na América Latina”, ou seja, gerará desemprego no Brasil e futuramente na América Latina.
Mas ao mesmo tempo, serviu para revelar mais equívocos no Partido dos Trabalhadores. A atuação do PT na defesa da fusão revelou a perda completa da perspectiva classista e internacionalista. Ao defender a fusão para preservar o caráter nacional e a manutenção do emprego, deixa de lado o interesse dos demais trabalhadores na condição de consumidores e abre caminho para o desemprego na América Latina.
As demais cervejarias da América Latina, considerando que seus mercados internos e suas escalas de produção são menores, teriam poucas chances já que a Ambev passaria a ser a terceira maior cervejaria do mundo. No caso da Argentina, com sua moeda atrelada ao dólar, que retira sua competitividade externa e interna, a situação é mais precária.
Assim, a defesa da expansão de um monopólio como “defesa do emprego” é o cúmulo do equivoco que um partido de “esquerda” pode cometer, mas revela os limites curtos de uma política de “esquerda” dentro dos limites do capitalismo: quando se acirram as contradições capitalistas, estes partidos acabam é defendendo monopólios privados. Teremos também a redução da receita para Estados e municípios, justamente quando estas estariam terminando a fase de isenção fiscal.
Devemos retomar a bandeira da luta pela expropriação da propriedade privada, que é resultado do roubo histórico de parte do trabalho pelo capital, somado ao fato que, principalmente no Brasil, estas empresas foram constituídas com dinheiro público, seja através do dinheiro estatal subsidiado, infra-estrutura estatal e vasta renúncia fiscal. Trabalhadores do mundo uni-vos nesta tarefa de reconquistar o que nos pertence.

José Menezes Gomes é professor de Economia da UFMA, doutorando em história econômica pela USP e co-autor do livro “A Crise Brasileira e o Governo FHC”, Editora Xamâ, 1997

O que foi a Grande Depressão?

http://mundoestranho.abril.com.br/historia/pergunta_286746.shtml
O que foi a Grande Depressão?



Foi a mais grave crise econômica mundial do século 20. Tudo começou por causa de um grande desequilíbrio na economia dos Estados Unidos. Durante a década de 1920, houve um rápido crescimento do mercado de ações no país, com os americanos investindo loucamente nas bolsas de valores, acreditando que elas se manteriam sempre em alta. Cidadãos comuns vendiam as próprias casas para comprar ações, atrás de um lucro fácil e, teoricamente, seguro. No entanto, em meados de 1929, a economia do país começou a dar sinais de que as coisas não iam tão bem assim. Os Estados Unidos entraram em recessão (queda no crescimento econômico) e muitas empresas haviam se endividado além da conta durante o período de euforia. Em outubro de 1929, diante desses sinais negativos, os preços das ações desabaram, provocando a quebra da Bolsa de Valores de Nova York.

O colapso na economia americana logo se espalhou pelo mundo, pois os Estados Unidos haviam se tornado o principal financiador dos países da Europa após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), conflito que enfraqueceu o continente. A crise também atingiu o Brasil, fazendo as vendas de café para o exterior, nosso principal produto de exportação na época, despencarem. "A quase falência da cafeicultura aumentou as tensões políticas, quando uma junta militar depôs o presidente Washington Luís e empossou Getúlio Vargas, líder da Revolução de 30", diz o economista José Menezes Gomes, professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

A Europa também sentiu os efeitos políticos da crise, pois a democracia e as idéias liberais ficaram desacreditadas, estimulando o surgimento do nazismo alemão e do fascismo italiano. A crise mundial, nascida nos Estados Unidos, começou a ser superada lá mesmo. Em 1933, o presidente Franklin Roosevelt lançou um programa chamado New Deal ("novo acordo", em inglês), realizando grandes projetos de obras públicas para promover a recuperação econômica. Mas a Grande Depressão só seria definitivamente encerrada anos depois, durante a Segunda Guerra (1939-1945).
Década perdida
Colapso da economia mundial marcou os anos 30

1929

Colapso da Bolsa de Nova York dá início à Grande Depressão. No Brasil, muitas fábricas fecham as portas e quase 2 milhões de trabalhadores perdem seus empregos

1932

O desemprego chega a 25% na Alemanha. Nos Estados Unidos, a produção da indústria cai para 54% dos níveis registrados em 1929

1933

Onze mil dos 25 mil bancos existentes nos Estados Unidos estão falidos. O governo americano lança o conjunto de reformas conhecido como New Deal

1936

A crisetermina na Alemanha graças à implantação de grandes obras públicas e ao aumento dos gastos militares pelos nazistas, que haviam chegado ao poder se aproveitando da Depressão

1941

A Grande Depressão é totalmente superada nos Estados Unidos depois que o país entra na Segunda Guerra Mundial. Os gastos militares também impulsionam a economia local

PAC está sustentado em idéias neoliberais

José Menezes Gomes: PAC está sustentado em idéias neoliberais
por jpereira última modificação 08/02/2007 17:05

Em entrevista, o economista José Menezes Gomes avalia que programa anunciado pelo governo Lula não trará crescimento econômico, ameaça direitos trabalhistas e pode acarretar danos gravíssimos ao meio ambiente

05/02/2007


O Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado ontem pelo governo, é um produto de marketing que visa ao convencimento da população de que as reformas neoliberais são essenciais para o crescimento econômico do país. A opinião é do economista José Menezes Gomes, professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e 3º tesoureiro do ANDES-SN. Em entrevista ao Informandes Online, Menezes afirma que o PAC busca uma continuação do projeto Avança Brasil, lançado por FHC em 1999. Para ele, o momento é de construção de uma grande mobilização dos trabalhadores dos setores público e privado. "Precisamos combater essas reformas que tirarão direitos para impulsionar a acumulação de capital", adverte.



O PAC realmente possibilitará o crescimento da economia brasileira?
José Menezes Gomes – Acredito que não, pois o essencial não foi alterado. Os juros continuam altos e cada vez mais há deslocamento de parte da riqueza para os rentistas, pois haverá aumento do pagamento dos juros da dívida pública este ano: 59,5% dos recursos do orçamento federal são destinados ao refinanciamento, amortização ou pagamento de juros da dívida pública. Em quatro anos o governo pretende investir R$ 67,8 bilhões, dividindo esse montante por quatro anos teremos algo em torno de R$ 16,95 bilhões – um volume próximo do atual. Outra coisa: o restante dos investimentos provém das parcerias público-privadas, ou seja, do setor privado, que investirá principalmente no setor de infra-estrutura, com ênfase na geração de energia, o que poderá acarretar danos ambientais gravíssimos.



É aí que entra a estratégia de regulamentação do artigo 23 da Constituição Federal?
Gomes - Sim. O governo pretende regulamentar o artigo 23 da Constituição de forma a facilitar o licenciamento ambiental de empreendimentos no setor de energia.

" A previsão é de que o governo deixe de arrecadar em torno de R$ 6,6 bilhões,
e para 2008 em torno de R$ 11,5 bilhões, com a redução
ou isenção de impostos. Esse valor poderia ser investimento
na saúde e na educação, por exemplo,
o que traria um resultado muito
melhor para a classe trabalhadora
"

Qual a relação entre isenção de impostos e mais investimentos?
Gomes - Para este ano, a previsão é de que o governo deixe de arrecadar em torno de R$ 6,6 bilhões, e para 2008 em torno de R$ 11,5 bilhões, com a redução ou isenção de impostos. O governo acha que deixando de arrecadar impostos do setor privado vai possibilitar investimentos, mas essa idéia não é se confirma. Houve desoneração da bolsa de valores de São Paulo, mesmo assim a alta valorização dos papéis nos últimos três anos não provocou o crescimento da economia, pois acabou ajudando à especulação. Os R$ 6,6 bilhões que deixarão de ser arrecadados este ano é quase o mesmo valor que se gasta com as universidades federais: R$ 7,8 bilhões. Esse valor poderia ser investimento na saúde e na educação, por exemplo, o que traria um resultado muito melhor para a classe trabalhadora.

A expressão "gargalos" é uma tentativa de construção ideológica para facilitar as reformas?
Gomes - Quando o governo afirma que os principais obstáculos ao crescimento são os "gargalos administrativos, burocráticos e legislativos", retira das determinações de ordem econômica a explicação fundamental do crescimento: taxas de lucro, juros e de câmbio. Deixa claro que a aprovação das reformas trabalhista, sindical, universitária e da previdência é decisiva para a retomada do desenvolvimento. É uma repetição dos argumentos dos governos neoliberais dos anos 90, que foram inadequados, pois onde as reformas mais avançaram o crescimento foi pífio. Esse é o caso da Argentina, que só foi capaz de crescer depois que declarou moratória da dívida pública.

"O que o governo Lula quer é justamente atrair capital inativo
dos países desenvolvidos para transformá-lo em "capital produtivo"
por sua conta e risco, através das parcerias público-privadas.
Isso nada mais é do que a reintrodução
do capitalismo sem risco para os investidores."

O que torna o investimento em infra-estrutura atrativo para o setor privado?
Gomes - As parcerias público-privadas são uma tentativa de gerar crescimento econômico sem investimentos públicos, e aí o governo delega essa tarefa ao setor privado. Isso nos remete ao governo imperial. Naquela época, ninguém queria montar ferrovias no Brasil, porque não havia mercado consumidor para o sistema de transporte ferroviário. Então o governo garantiu aos banqueiros ingleses, que tinham um volume de capital excedente muito grande, que se eles montassem nossas ferrovias, mesmo sem demanda privada, teriam assegurada uma rentabilidade de 7%. O que o governo Lula quer é justamente atrair capital inativo dos países desenvolvidos para transformá-lo em "capital produtivo" por sua conta e risco, através das parcerias público-privadas. Isso nada mais é do que a reintrodução do capitalismo sem risco para os investidores. O ProUni é um exemplo bem apropriado: o setor privado da educação se expandiu de forma desordenada e quando não tinha mais consumidores, mas sim uma inadimplência muito alta, o governo criou um sistema que abatia impostos, como agora. Deixando de arrecadar, incentivou o setor privado, transformando estudantes pobres em consumidores de um serviço que poderia ser público se os recursos oriundos dos impostos fossem investidos nas universidades públicas. O PAC é uma "ProUnização" de outras áreas que passarão a ser mais atrativas para o setor privado. E essa atratividade vem justamente da flexibilização das leis trabalhistas (retirada de direitos), da desregulamentação sindical e outras que virão com as reformas neoliberais que possibilitarão o aumento do grau de exploração e a transformação de áreas do setor público em áreas de valorização do capital.

Há similaridades entre as medidas anunciadas com o PAC e medidas adotadas pelo governo FHC...
Gomes - O PAC é uma continuidade do projeto Avança Brasil, lançado por FHC em 1999, após a mudança da política cambial e a desvalorização do Real. As obras anunciadas em seis rodovias eram previstas no Avança Brasil, das quais destaco três: duplicação do trecho Belo Horizonte-Governador Valadares da BR-381, da BR-153 na divisa Mato Grosso-Goiás e no trecho Palhoça/SC-Osório/RS da BR-101.

"Dentro do capitalismo não há possibilidade de crescimento econômico
estável. A maior fase de crescimento econômico brasileiro
foi nos anos 70. Essa época foi justamente
a de maior aprofundamento da dívida pública"

Quais as possibilidades reais de crescimento econômico?
Gomes - A instabilidade econômica é própria do capitalismo. Crescimento econômico não tem sido prática nos Estados Unidos, União Européia e Japão, que representam a maioria do PIB mundial. Ao contrário de crescimento econômico, o que houve em 2006 foi uma expansão do capital financeiro mundial (ações, títulos públicos e depósitos bancários) que atingiu 140 trilhões de dólares, mais que o triplo do PIB mundial. Para o governo, esse excesso de liquidez seria uma das fontes de atração de capital privado. Dessa forma, as possibilidades desses investimentos estariam atreladas aos rumores do mercado mundial, sensível a uma aceleração da taxa de juros dos Estados Unidos, especialmente. Somente China, Índia e alguns países produtores de commodities tiveram taxa de crescimento acima de 5%. Então, dentro do capitalismo não há possibilidade de crescimento econômico estável. A maior fase de crescimento econômico brasileiro foi nos anos 70. Essa época foi justamente a de maior aprofundamento da dívida pública. O Estado não só liberou crédito, foi comprador, reprodutor e, principalmente, foi banqueiro, criou todas as condições para impulsionar os agentes privados. Agora, está com a dívida cada vez maior e quer dar um caráter mercantil às suas próprias funções, transformando o serviço público num espaço de valorização novo do capital privado, por conta e risco do setor público

Mais uma vez, os trabalhadores terão que se mobilizar contra medidas que beneficiam somente os ricos?
Gomes - Sim. É o momento de construir uma grande mobilização dos trabalhadores dos setores público e privado. Precisamos combater essas reformas que tirarão direitos para impulsionar a acumulação de capital. A intenção do governo é assegurar o rendimento dos setores rentistas (banqueiros e fundos de pensão) através de mais uma reforma da previdência e das reformas sindical e trabalhista. A reforma universitária, por sua vez, visa à intensificação da mercantilização da educação para abrir mais espaço para a valorização do capital. Para a população que paga muito imposto e recebe quase nada em contrapartida, as parcerias público-privadas poderão representar mais pedágios e tarifas elevadas.

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Entrevista publicada originalmente no site do Andes

Dinheiro do reajuste salarial de servidores públicos se converteu em lucros dos banqueiros e fundos de pensão”, denuncia economista

28.3.08
“Dinheiro do reajuste salarial de servidores públicos se converteu em lucros dos banqueiros e fundos de pensão”, denuncia economista
Por Najla Passos

ANDES-SN

O professor de Economia da Universidade Federal do Maranhão – UFMA e 3º tesoureiro do ANDES-SN, José Menezes Gomes, mostra, nesta entrevista ao Informandes Online, como os servidores públicos federais são forçados a pagar a conta da política de juros altos e dos efeitos da crise econômica dos Estados Unidos. Menezes denuncia, ainda, que o governo Lula tem dois pesos e duas medidas no trato com o capital financeiro e com os servidores públicos. A proposta salarial para os docentes é um exemplo dessa lógica que privilegia o capital financeiro em detrimento dos trabalhadores. Confira:

Informandes Online - Qual é a base da pauta de reivindicações dos docentes e o que o governo Lula contrapõe a essas reivindicações?
José Menezes Gomes - A campanha salarial dos docentes em 2007 tinha como objetivo retomar o poder de compra que nós docentes tínhamos em 1995. Nossa intenção era que voltássemos a ganhar o que estávamos ganhando naquela época, incluindo o que foi retirado do nosso plano de carreira e o que foi retirado pela não-compensação da inflação. Em 1995, é bom lembrar, a despesa do governo com pessoal correspondia a 56,2% da receita corrente líquida da União. Em 2005, essa mesma despesa corresponde a 27,35%, conforme dados do próprio Ministério da Fazenda. Isso mostra que, de 95 pra cá, o salário de todos os servidores passou a ter um peso cada vez menor em relação à Receita Corrente Liquida da União. Esse é um fato fundamental, ou seja, o não atendimento da pauta dos professores, e da maior parte dos servidores públicos se deve exatamente a uma outra prioridade que foi dada.

- É aí que entra a relação entre o arrocho salarial imposto pelo governo Lula aos servidores e a opção pelo pagamento da dívida pública?
- Exato. O governo alega que não tem dinheiro para compensar as perdas provocadas nos salários dos servidores públicos. Mas, ao mesmo tempo, se pegarmos o que foi gasto com os juros da dívida nos últimos cinco anos do governo Lula, chegamos a R$ 851 bilhões. Isso corresponde a 22 vezes o valor arrecadado com a CPMF. O que aconteceu é que o governo Lula honrou todos os compromissos assumidos na era FHC com o capital financeiro. E não só honrou, também aumentou o percentual de superávit primário e o volume de pagamento de juros da dívida. Entretanto, não honrou os compromissos com os servidores públicos. E, assim, nós deixamos de ter a compensação integral da inflação. O dinheiro que não veio para o reajuste foi para o lucro dos banqueiros e dos fundos de pensão. A extinção da CMPF ser usada pelo governo como justificativa para não pagar os reajustes é uma falácia, uma vez que esse imposto não foi criado com tal finalidade. Nós tivemos CPMF durante muito tempo e não tivemos reajuste. Na verdade, parte dos recursos destinados a reajustes de salário vai para o pagamento da dívida pública, principalmente nos últimos anos. O governo brasileiro passou a comprar cada vez mais dólares e, para isso, ele passou a aumentar a dívida pública, ou seja, os efeitos da crise vinda dos EUA, especialmente neste ano, já estão sendo repassados para os servidores públicos.

- Mas o governo Lula não tem alardeado que pagou a dívida externa e que o Brasil agora não é mais devedor? Afinal, o Brasil pagou ou não pagou a dívida?
– Para responder a essa questão, temos que saber o que determinou a expansão dessas reservas cambiais até US$ 190 bilhões. Essas reservas não resultaram de um superávit das transações correntes, mas, sim, da crescente compra de dólares pelo Banco Central com intuito de evitar uma desvalorização ainda maior da moeda estrangeira, o que prejudicaria o setor exportador. Isso se converteu em dívida pública. Acontece que quando o governo aumenta a dívida pública, ele está comprometendo, cada vez mais, o dinheiro público com o pagamento da dívida pública, em detrimento do reajuste dos servidores e dos investimentos sociais.

- Então, considerando esta política econômica do governo Lula e a crise na economia dos EUA, quais são as possíveis conseqüências para os trabalhadores brasileiros?
- Toda crise capitalista começa penalizando os capitalistas, mas no final quem paga a conta é o trabalhador. Foi assim na crise de 1929. Logo após o colapso da Bolsa de Nova York, os cafeicultores brasileiros entraram em crise porque não tinham para quem vender o produto. Então, o Estado brasileiro comprou o estoque de café. Mas o café não podia ser distribuído porque baixaria o preço do produto. A opção foi queimá-lo. Mas o governo também não podia parar a atividade cafeeira, então, chegou ao absurdo de comprar café, queimar café e ainda liberar crédito para plantarem mais café. Outro exemplo é o que aconteceu agora com a Inglaterra, que acabou de estatizar o banco mais atingido pela crise imobiliária dos Estados Unidos, o Northern Rock. O que estamos vivendo agora é o auge da crise do neoliberalismo, que traz, de um lado, crise bancária e, de outro, estatização de bancos. Isso resulta em aumento da dívida da Inglaterra, aumento da dívida dos Estados Unidos e uma nova justificativa para não se gastar com o serviço público. O neoliberalismo se instalou nas últimas décadas, e tudo que foi feito para conter a crise do capitalismo foi insuficiente. Tudo o que já foi feito, todas as reformas, toda a retirada de direitos dos trabalhadores, todo o pagamento da dívida pública, em todos os países, tudo isso não foi suficiente para conter a crise capitalista. Hoje ela apresenta ainda mais acentuada e, mais uma vez, quem é chamada para pagar a conta é a classe trabalhadora. É para isso que nós queremos alertar: é necessário construir um movimento, por meio da Conlutas, principalmente, que canalize todas as reivindicações dos trabalhadores para que a dívida pública não seja paga e a dívida social seja contemplada. Temos que denunciar que tudo o que já foi pago, mais de R$ 1,3 trilhão pagos da dívida pública nos últimos 12 anos, não impediu que a dívida pública continuasse atingindo o montante de R$ 1,3 trilhão. E, mesmo assim, o que temos é uma crise que cada vez se acelera mais e, quanto mais acelera, mais dinheiro público vai sendo usado para contorná-la.

- Analisando, agora, especificamente a proposta do governo para os docentes, tanto do ensino superior quanto do primeiro grau. O que essa proposta representa? Quais os prejuízos embutidos nela?
- Em primeiro lugar, ela não compensa as perdas salariais da era FHC e não assegura a reposição dos valores perdidos na era Lula. A maior parte do reajuste proposto é para 2010, quando o governo Lula não estiver mais no poder. Está-se responsabilizando o próximo governo pelo reajuste dos servidores. E o mais grave é que o governo propõe um reajuste sem saber qual será a inflação deste ano, a do ano que vem e, muito menos, a de 2010. E isso justamente quando o petróleo sobe assustadoramente, já ultrapassando os US$ 100 por barril, e todos os alimentos estão se elevando bastante, ou seja, ocorre o ressurgimento da inflação em vários setores. Nesse quadro, se não houver um mecanismo que reponha o gatilho da inflação do período, é muito arriscado assinar um termo de acordo. Não há nenhum indexador para a maior parte do reajuste proposto e, o pior, não há nenhum instrumento jurídico que nos assegure seu efetivo cumprimento. E nós sabemos que este governo é caracterizado pelo não-cumprimento de vários acordos firmados com os trabalhadores. Muitos dos acordos retomados agora são do ano passado que já não foram cumpridos. Além disso, a proposta do governo valoriza o professor em regime de 20 horas dentro do princípio do REUNI, ao invés de valorizar a Dedicação Exclusiva. Essa proposta prevê um reajuste maior em todos os níveis para os professores com regime de 20 horas. Uma outra coisa preocupante: a GED é mantida, sem que ocorra sua incorporação ao salário. Os professores substitutos, que são cerca de 20% da categoria, não terão reajuste e nem nenhuma perspectiva de reposição da inflação. A incorporação da GAE e da GED possibilitaria que esses professores também tivessem reajuste. É uma situação bastante preocupante: não é justo que um professor substituto com graduação ganhe aproximadamente R$ 800. Até mesmo nos governos estaduais, um professor do ensino médio ganha mais do que isso. A não-incorporação da GED acarreta outro problema: abre espaço para que a gratificação seja regulamentada de forma a forçar o aumento da jornada de trabalho. É esse o fato mais grave: com a provável regulamentação da GED, o professor poderá ter que aumentar muito sua jornada de trabalho para conseguir garantir um ganho salarial um pouco melhor. Ou seja, isso, de certa forma, é um modo de cumprir a meta do REUNI, que é aumentar o número de alunos na sala de aula, aumentar o número de cursos, sem aumentar, proporcionalmente, o número de professores. Esta é a maior armadilha embutida na proposta do governo. Na essência, o que temos é a desconstrução de todo o plano de carreira que a categoria conquistou em 1987 – o PUCRCE. A separação entre ensino superior e ensino de 1º e 2º grau, e a criação de uma nova carreira para esses últimos, mostra exatamente isso.

- Como os docentes podem enfrentar essa política do governo Lula?
- O fundamental é a retomada da campanha salarial, com o esclarecimento junto a todos os professores, nas assembléias departamentais, nas assembléias dos sindicatos, em todos os espaços possíveis, do que significa a proposta imposta pelo governo. Essa proposta não resolve nossos problemas. Ao contrário, mantém uma tendência de perdas salariais com o objetivo de economizar recursos para pagar a dívida pública. E, também, cria meios para forçar os professores a trabalhare muito mais. De acordo com a proposta do ANDES-SN, o professor com doutorado deveria ganhar, já em 2007, R$ 11.733. Hoje, ele ganha em torno de R$ 5,5 mil. Precisamos denunciar que a prioridade do governo Lula é o pagamento da dívida pública, paga com o dinheiro que deveria ser investido na recomposição das perdas salariais de todos os servidores públicos e nos serviços essenciais para a população. O dinheiro que sai do nosso reajuste para o pagamento da dívida é imediatamente apropriado pelo setor financeiro, ou seja, sai dos nossos bolsos e cai nos daqueles que vivem de renda, daqueles que mais ganham com a especulação. Se crise dos EUA se prolongar, o governo Lula certamente vai tentar tirar mais dinheiro dos trabalhadores para amenizar a crise provocada pelo capital. Para combater isso, temos que construir uma política que unifique a classe trabalhadora em torno de suas necessidades imediatas, tendo a Conlutas como referência.

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