domingo, 22 de novembro de 2009

DÍVIDA PÚBLICA: PORQUÊ DECLARAR MORATÓRIA

ENTREVISTA
DÍVIDA PÚBLICA: PORQUÊ DECLARAR MORATÓRIA
http://www.andes.org.br/Informandes19.12.06-pg2.htm
A dívida pública brasileira vem crescendo a cada ano e sufocando a possibilidade de investimentos nas áreas mais essenciais do país. Ano a ano assistimos aos sucessivos governos cortarem o que consideram gastos públicos, em detrimento do compromisso firmado com os credores das dívidas interna e externa. A situação é grave: 59,5% dos recursos previstos no orçamento 2007 são destinados ao refinanciamento, amortização e pagamento dos juros da dívida pública. São bilhões que deixarão de ser aplicados na melhoria da educação, saúde, habitação, saneamento, reforma agrária etc.

O sacrifício do pagamento dos juros, no entanto, tem sido em vão. Quanto mais pagamos a dívida, mais devemos. Em julho de 1994 devíamos R$ 62 bilhões. Atualmente, devemos R$ 1 trilhão.

O economista José Menezes Gomes, professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e 3º tesoureiro do ANDES-SN, fala sobre a origem da dívida pública, analisa os impactos da dívida para países pobres e ricos e alerta para a necessidade da suspensão do pagamento dos juros como uma mudança estrutural da política econômica.

- Qual foi a principal causa do crescimento monstruoso da dívida pública brasileira?
"Elevar as taxas de juros tornou nossos títulos públicos mais atraentes. Só que isso acionou o motor do endividamento. Devíamos R$ 62 bilhões em 1994. Hoje, devemos R$ 1 trilhão."

- Bom, o primeiro motivo foi a transformação da dívida externa privada em dívida interna do Estado, em 1980. Depois, veio o Plano Real com sua lógica de fortalecer a moeda sem mudar a estrutura da economia. O Brasil tinha uma moeda fraca, uma inflação alta e, de repente, sem muitas mudanças na estrutura da economia, transformou-a em moeda forte e passamos a ter inflação baixa. Foi uma verdadeira mágica que fez com que o Real chegasse a valer mais que o dólar. Essa “mágica” teve um preço, pois sua política central consistia em elevar a taxa de juros para atrair moeda estrangeira para formação de reservas cambiais. Com essas reservas cambiais o país manteve a paridade do Real, em compensação, a elevação dos juros resultou na elevação da dívida pública. E quando elevo a dívida pública tenho que aumentar ainda mais a taxa de juros, pois quando esse modelo desgastou houve risco de fuga de capital para outros países. Elevar as taxas de juros tornou nossos títulos públicos mais atraentes. Só que isso acionou o motor do endividamento. Devíamos R$ 62 bilhões em 1994. Hoje, devemos R$ 1 trilhão. O aumento da dívida aconteceu porque a política monetária brasileira e da maioria dos países da América Latina é a política monetária do rentista. A questão central é: nossa política monetária acaba transformando as funções fundamentais do Estado, que passa a não investir em infra-estrutura, saúde, educação – tudo aquilo que justifica a existência de um estado nacional. Na verdade, o Estado que temos hoje é voltado para atender aos interesses de uma política monetária que atende a três grupos essenciais da economia: banqueiros, grandes capitalistas que também compram títulos públicos e os fundos de pensão. É uma política de juros que serve apenas para transformar em algo altamente rentável os títulos públicos.

- Qual a origem dessa dívida?
"A trajetória do desenvolvimento capitalista recente mostra que quanto mais o Estado agiu no sentido de contornar as crises do capital, mais ampliou suas contradições e ficou vulnerável aos agentes privados"

- Se analisarmos a história do capitalismo veremos que a dívida pública foi um elemento fundamental no processo de acumulação primitiva. O estado tomava emprestado recursos do chamado capital usurário para criar infra-estrutura necessária ao desenvolvimento do capitalismo – fomentar empresas, criar condições de funcionamento dos mercados, conquistar mercados mais próximos etc. Ou seja, o estado se endividou muito já na origem do capitalismo. Mas ao contrário do que afirmam alguns, quanto mais o capitalismo se desenvolveu, mais necessária tornou-se a intervenção do Estado no sentido de assegurar as condições ideais da produção do capital. O Estado passou a criar cada vez mais políticas para conquistar mercados externos e passou a ser um grande consumidor através dos gastos militares etc. Quanto mais os capitalistas se desenvolveram e chegaram à fase monopolista, mais precisaram de dinheiro para desenvolver políticas de interesse do capital. E a dívida pública foi contraída não para resolver os problemas sociais, mas os problemas do capital. A década de setenta foi de grande crescimento econômico para o Brasil. Naquela fase o governo criou uma forma de endividamento através de incentivos fiscais, subsídios, créditos etc., liderou, facilitou, o desenvolvimento do capitalismo, o que não foi suficiente para resolver o problema fiscal do Estado. A trajetória do desenvolvimento capitalista recente mostra que quando mais o Estado agiu no sentido de contornar as crises do capital, mas ampliou suas contradições e ficou vulnerável aos agentes privados, ou seja, o Estado usa dinheiro público para ajudar o setor privado, depois, sua dívida pública se eleva e para rolar essa dívida eleva a taxa de juros para que o próprio setor privado compre os títulos públicos e continue rolando suas dívidas. Então, na verdade, a dívida pública é, principalmente, resultado da política de favorecimento ao setor privado.

- Dever não é uma exclusividade dos países pobres. Países ricos como os Estados Unidos têm dívidas bem maiores do que o Brasil. Por que, para nós, a dívida é tão mais nociva?
"O grande segredo não é o tamanho da dívida, mas a condição que eu tenho pra rolar essa dívida"

- O grande segredo não é o tamanho da dívida, mas a condição que eu tenho pra rolar essa dívida. Os Estados Unidos, que devem sete trilhões de dólares - quase 70% de seu PIB, têm a facilidade de se endividar na sua própria moeda, nós, não. Durante muito tempo nos endividamos com o chamado Overnight, de curtíssimo prazo e juros elevadíssimos. Depois, nos endividamos em variação cambial, em títulos indexados por taxas como Selic, a índices de preços, ou seja, vamos rolando a dívida pública e pagamos hoje a taxa básica de 13,25%. Nos Estados Unidos, essa taxa é de 4,50%. No Japão, 0,25%. Na União Européia, 3%; na Inglaterra, 4,75%. O problema não é só dever – o que já é bastante grave – mas dever rolando a dívida numa taxa de juros tão alta – a taxa de juros real mais alta do mundo! Hoje, com a inflação de 4%, a taxa real de juros chega a quase 10%. Esse rendimento real é mais elevado que vários investimentos do setor privado. Os Estados Unidos estão extremamente endividados, mas mesmo oferecendo uma taxa de juros muito baixa, muitos procuram seus títulos porque eles oferecem garantias, pois têm hegemonia política, econômica, e em todos os sentidos.

- O que é pior: a dívida interna ou a externa?

- Bom, a dívida externa normalmente deveria ser dívida privada, pois é a relação da nossa economia com outros países, e a dívida pública é uma dívida contraída pelo estado junto a investidores nacionais ou internacionais. Daí, dívida pública também pode ser dívida externa. Nos últimos anos o Brasil acabou se endividando em aproximadamente 40 bilhões de dólares. Foram emitidos títulos no mercado internacional e dessa forma você tem uma dívida pública que já é naturalmente dívida contraída no interior. O fundamental é que nesse momento a taxa de juros externa é muito mais baixa que a taxa de juros interna. O governo brasileiro, quando liquidou parte da dívida externa com taxa de juros a 4% ou 5% ao ano e contraiu dívida pública a 14%, transformou isso num grande fato de política governamental. Ou seja, a liquidação da dívida externa acabou sendo um acelerador da dívida interna.

- O que fazer para sair dessa situação?
"É primordial que se faça uma campanha esclarecendo para a população qual é a natureza, a magnitude e as implicações da dívida pública "

- É primordial que se faça uma campanha esclarecendo para a população qual é a natureza, a magnitude e as implicações da dívida. Normalmente, a grande imprensa não aborda os pontos essenciais da dívida. A outra coisa: é necessário que se construa uma solidariedade entre os trabalhadores não só do Brasil, mas em toda a América Latina, a exemplo do que aconteceu nos anos 80 - uma espécie de aliança dos países devedores para a elaboração de uma estratégia de ação conjunta para declaração de moratória. Não há mais como pagar a dívida pública. Se pegarmos os dados da Secretaria do Tesouro Nacional vamos ver que a dívida pública já foi paga várias vezes. Agora, não se pode fazer isso de forma isolada, é necessário que se construa um grande movimento para que os países possam propor não pagar a dívida pública e pagar a dívida social. Todo esse dinheiro que está sendo pago no Brasil, R$ 179 bilhões em 2006, deveria ser revertido para investimentos em saúde, educação, segurança, reforma agrária, habitação... ou seja, deveria ser utilizado para o estado brasileiro pagar a dívida social que contraiu, pois durante toda sua trajetória esse estado sempre agiu para atender às demandas privadas. Depois, deveríamos realizar uma conferência latino-americana para discutir quais são os impasses colocados pela dívida pública e quais são as bandeiras de luta que a classe trabalhadora deve ter como eixo para que cada governo pegue esse dinheiro da dívida pública e invista na resolução dos problemas sociais.

- Quais seriam as conseqüências da moratória para os brasileiros?
"Quem perderia com a suspensão do pagamento da dívida pública seriam os banqueiros e os fundos de pensão, que ganham fortunas"

- Se o ato de declarar a moratória for um ato de declarar a luta pelos interesses da maioria da população, dos 56 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza, e dos demais que também enfrentam dificuldades para viver, terá grande aceitação popular. Oitenta porcento dos brasileiros sequer têm conta bancária, ou seja, não ganham com os títulos públicos. Milhões de pessoas não têm a menor idéia de quais são as vantagens de pagar a dívida pública. Quem perderia com a suspensão do pagamento da dívida pública seriam os banqueiros e os fundos de pensão, que ganham fortunas. Os bancos tiveram lucros de mil por cento, e parte deles vêm dos títulos públicos, das tarifas altas etc. Mas os banqueiros e fundos de pensão não representam nem 1% da população brasileira. Os verdadeiros beneficiários da moratória seriam os 56 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza e outros que nunca tiveram suas demandas atendidas. A moratória indica uma mudança de eixo na política econômica. Imagina o Brasil ter dinheiro para investir mais nas universidades, na saúde e na Reforma agrária, ou seja, pagar sua imensa dívida social!

Governo anuncia nova etapa do "grande negócio"

REFORMA DA PREVIDÊNCIA
Governo anuncia nova etapa do "grande negócio"
http://www.andes.org.br/Informandes49_previdencia.htm
Por Elizângela Araújo
ANDES-SN

As alterações anunciadas pelo secretário da Previdência, Helmut Schwarzer, para a previdência dos servidores públicos federais, interessam basicamente aos fundos de pensão, banqueiros e outros rentistas. A análise é do economista José Menezes Gomes, professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Maranhão – UFMA e 3º tesoureiro do ANDES-SN.

De acordo com notícias veiculadas pela imprensa esta semana, o governo pretende enviar ao Congresso Nacional, até o final deste ano, um projeto de lei igualando as regras de aposentadorias e pensões dos funcionários públicos federais às que hoje vigoram para os trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT. Entre os pontos do projeto, segundo Schwarzer, estará a limitação do valor da aposentadoria a 10 salários mínimos. Quem pretendesse receber benefício acima desse teto teria que contratar um plano de previdência complementar.

As novas regras, segundo o secretário da Previdência Social, valerão para os servidores que ingressarem a partir de 2010 nos poderes Executivo, Judiciário, Legislativo e no Ministério Público, mas não para os militares. Estados e municípios deverão aderir às regras mais tarde.

Menezes explica que ao impor um teto para o valor da aposentadoria e forçar os servidores a pagarem planos de previdência complementar, o governo poderá enfraquecer o sistema público, como aconteceu no Chile e na Argentina, por exemplo. "Além disso, o dinheiro aplicado nos fundos de pensão é sujeito às flutações do mercado e dos rumos dos títulos públicos", completa.

Para o economista, a privatização do sistema previdenciário só interessa aos banqueiros, aos administradores dos fundos de pensão e outros rentistas, responsáveis por gerir as contribuições mensais dos trabalhadores. No Brasil, os fundos administram ativos da ordem de R$ 400 bilhões, ou seja, boa parte do PIB brasileiro, que é de R$ 2,5 trilhões. “Esse dinheiro está aplicado, em grande parte, em títulos públicos e ações, ou seja, os fundos se beneficiam do aumento da taxa de juros e boa parte dos gastos do governo com o pagamento desses juros é destinada a esses fundos, que são verdadeiros parasitas do dinheiro público”.

Os fundos de pensão participam da gestão de várias empresas e os seus representantes, que são trabalhadores, adotam a mesma lógica patronal de enxugamento das despesas e implementação da reestruturação produtiva. Para Menezes, esse é o grande problema da privatização da previdência, pois, para assegurar o complemento à aposentadoria, esses trabalhadores se aliam aos capitalistas e passam a conspirar contra os demais trabalhadores.

O sociólogo Edmundo Fernandes Dias, professor aposentado do Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de Campinas, explica que a reestruturação capitalista, como prefere chamar, requer reformas no Estado, que passa a ser gerido por critérios empresariais e não mais sociais.

Jà Menezes também lembra que o governo Lula destinou, em cinco anos, R$ 851 bilhões para o pagamento dos juros da dívida pública. “Dinheiro que deveria ser destinado à reposição das perdas salariais dos servidores públicos da era FHC/Lula, à reforma agrária, saúde, educação e segurança, ou seja, os serviços essenciais, cada vez mais caros e inacessíveis para uma grande parte dos brasileiros”.

Previdência é objeto de investidas do capital
No artigo Seguridade Social Brasileira: Desenvolvimento Histórico e Tendências Recentes*, a pesquisadora Ana Elizabete Mota, da Universidade Federal de Pernambuco, afirma lembra que "do ponto de vista histórico, a seguridade social é por definição esfera de disputas e negociações na ordem burguesa. Erigida no campo de luta dos trabalhadores, ela é sempre e continuamente objeto de investidas do capital no sentido de "adequá-la" aos seus interesses".

Mota lembra, também, que “a reforma da Previdência aprovada pelo Congresso Nacional no governo Lula dá prosseguimento à agenda de reformas iniciadas por Fernando Henrique Cardoso, consolidando o cumprimento das exigências dos organismos financeiros internacionais”. Nesse ponto, vale destacar que, logo após o Brasil ter obtido grau de investimento, no final de abril, a agência classificadora de risco Standard&Poors afirmou, conforme matéria do jornal O Estado de São Paulo (3/5/08), que o Brasil obteve a classificação em razão do aumento da confiança dos investidores na capacidade e disposição do governo de reduzir sua dívida. De acordo com a Standard&Poors, o Brasil precisa perseguir reformas econômicas que reduzam a relação entre a dívida pública e o PIB. A agência sugeriu que seja feita uma nova reforma da Previdência, "mais profunda em direção a outros tipos de composição de gastos governamentais".

Nesse contexto, os trabalhadores deverão se unir para lutar contra mais um ataque à previdência social. Menezes diz que quando as estatais federais foram privatizadas pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, na década de 90, o Estado arrecadou cerca de US$ 105 bilhões, o equivalente atual a cerca de R$ 180 bilhões. “Essa nova etapa da privatização da previdência resultará num volume de recursos muito maior do que a da privatização das estatais, e esse é o grande negócio que o governo Lula quer acertar. Como dizia Francisco de Oliveira, professor aposentado da PUC-SP, em entrevista à ADUSP por ocasião da PEC 40, pela qual o governo Lula iniciou a reforma da Previdência logo no início do seu primeiro mandato, “é preciso dizer a que vem essa reforma da Previdência: se trata de negócios, companheiros! E deixemos de mistificações ideológicas, trata-se de negócios.”

O economista da UFMA lembra que boa parte do R$ 1,3 bilhão pago a título de juros da dívida pública pelo governo brasileiro, nos últimos 12 anos, foi parar nas contas dos fundos de pensão. Ele diz que essa realidade não é a mesma de boa parte dos países, tanto desenvolvidos quanto em desenvolvimento.

Menezes critica, ainda, o fato de o governo incentivar os trabalhadores a contratarem planos de previdência complementar. “Há até desconto no Imposto de Renda para quem paga plano de aposentadoria privada. Temos um governo preocupado apenas com os interesses dos rentistas, e a CUT aprova essa reforma porque o setor majoritário dos fundos de pensão está dentro dessa Central”.

Para Menezes, os servidores públicos têm que lutar pela revogação da reforma da Previdência, que instituiu o fator previdenciário e a contribuição compulsória dos aposentados.

*Publicado na Revista do Fórum Nacional de Educação das Profissões na Área de Saúde - Fnepas

FGTS:Garantia ou insegurança

FGTS:Garantia ou insegurança
25/10/2000
JOSÉ MENEZES GOMES
http://www2.uol.com.br/tododia/ano2000/outubro/dia25/cidades.htm
Antes da criação do FGTS - Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - (lei 5.107 de 13/09/66), vigorava a lei que estabelecia garantia a estabilidade no emprego, quando o trabalhador atingisse dez anos na mesma empresa. Este fundo é constituído por uma contribuição compulsória por parte do empregador, equivalente a 8% da remuneração mensal do empregado. Sua finalidade era a formação de um pecúlio para os casos de aposentadoria, morte ou invalidez do trabalhador.
Por outro lado, para o capital surgiu a correção monetária para dar garantia efetiva aos ativos em relação a inflação, especialmente aos títulos da dívida pública.
Para garantir que este fundo fosse de mais longo prazo foram criados condições que condicionava o saque, da totalidade dos recursos, ao falecimento ou doença grave, pagamento de dívidas na aquisição de imóveis, aposentadoria, demissão sem justa causa, falência da empresa etc.
A insegurança no trabalho é um dos componentes do controle patronal. Ela esteve presente nos primórdios do capitalismo e assumiu várias formas no seu desenvolvimento, como também buscou-se criar mecanismos que a reduzisse. No entanto, no desenvolvimento capitalista ela é indispensável para manter um exército industrial de reserva.
No Brasil, nas últimas décadas, tivemos três momentos distintos de legislação. Até 1967 tínhamos estabilidade no emprego após 10 anos de trabalho na mesma empresa como marca do nacional-desenvolvimentismo. Daí até o governo FHC tivemos a introdução do FGTS como forma de “atenuar” os efeitos da demissão. Com FHC tem início as várias reformas que introduzem o trabalho temporário que minimizam o sentido não só do FGTS como também da previdência, visando diminuir os encargos e “gerar” mais emprego. Cada etapa representou um grau determinado de flexibilização.
Quando se perde a perspectiva histórica acaba-se por considerar, por exemplo, que o FGTS era uma conquista em relação ao trabalho temporário, mas na verdade era uma derrota em relação a estabilidade vigente anteriormente. Portanto, a retirada de direitos dos trabalhadores não é uma característica apenas do governo FHC. Este foi sim a fase mais intensa. Sua fase inicial se dá com o regime militar, quando começava a crise capitalista, hoje em fase acelerada, na preparação para uma nova etapa da acumulação e na inexistência de liberdade de organização sindical e política,.
Além da insegurança inerente a introdução do FGTS que facilitava demissões, outras surgiram em seguida. A primeira era como evitar a sonegação por parte de muitos patrões que burlavam esta obrigação. A segunda era como preservar o poder de compra deste fundo no momento de utilização pelo trabalhador e por último como estabelecer a gestão destes recursos de forma transparente.
Sobre a manutenção do poder de compra desse fundo, um estudo elaborado pela Subseção do Dieese na Federação Nacional das Associações do Pessoal da CEF (Fenae), mostrou que a correção monetária dos saldos das contas vinculadas dos trabalhadores foi incapaz de manter o valor real do dinheiro depositado pelo empregador em benefício futuro do empregado.
Deixando de lado a remuneração do FGTS (3% ao ano, em geral), se numa conta do trabalhador tivesse sido depositado R$ 100,00, em janeiro de 1967, sem haver saques desde então, em 10 de abril de 1997, o valor do depósito corresponderia a apenas R$ 16,78., ou seja, a inflação e os expurgos dos planos econômicos corroeram o saldo das contas do FGTS dos trabalhadores nos últimos trinta anos (Boletim Dieese maio/97).
Segundo o Dieese, isso foi possível porque os índices que corrigiam as contas vinculadas variaram quase sempre abaixo da inflação, exceção feita para os anos de 1971, 1981, 1982, 1986, 1995 e 1996. Esta correção abaixo da inflação, no entanto, revela que a introdução do FGTS não tinha como objetivo diminuir a insegurança no trabalho mas criar um fundo de financiamento de obras públicas (saneamento, habitação e infra-estrutura) com remuneração inferior as taxas de mercado, pois apesar deste fundo ter gestão tripartite, quem decide a remuneração e onde aplicar é o próprio governo.
Desta forma estes recursos acabaram sendo moeda de troca eleitoral para aqueles que apoiavam o governo, envolvendo diretamente os construtores e empreiteiros às custas do confisco dos trabalhadores. Assim, foi também base para muitas obras superfaturadas para financiamento de campanhas.
Depois de mais de dez anos tramitando na Justiça o pedido de reparação das perdas pelos expurgos dos planos Verão (jan/89) e Collor I (abril/90), finalmente o STF deu ganho de causa aos trabalhadores. Imediatamente veio o discurso de que o pagamento de quase R$ 40 bilhões iria ameaçar a “estabilidade da moeda” e as metas do FMI. Apesar do governo anunciar de forma eleitoreira, que os trabalhadores receberiam a correção independente de entrarem na justiça, as últimas iniciativas são no sentido de se jogar esta dívida para os precatórios para pagamento em dez anos. Assim, mais uma vez o FGTS tornou-se a fonte de insegurança e incertezas.
Esta tentativa de burlar direitos e atropelar decisões judiciais se deve ao fato que o dinheiro do tesouro nacional está direcionado para pagamento dos juros da dívida pública e externa ou para salvação de bancos como o Proer.
A crise capitalista, além de exigir uma maior insegurança no trabalho, requer também uma segurança para o capital com a transferência liquida de dinheiro público.
Porém, não podemos esquecer que para acabar com a insegurança do trabalho, em todos os sentidos, é necessário superar a classe dominante e a propriedade privada que fundamentam esta sociedade.

José Menezes Gomes é
professor da UFMA e Doutorando em História Econômica na USP

Acordo da Basiléia-outro caminho para privatização

Acordo da Basiléia-outro caminho para privatização por José Menezes Gomes
Local: Rio Branco - AC
Fonte: O Rio Branco - (19/09/2001)
Link: http://www.oriobranco.com.br/
José Menezes Gomes (Professor da UFMA e Doutorando USP) A criação do fórum de estabilidade financeira fez surgir um novo acordo de regras de capitalização da Basiléia. Pretende-se em tese, aumentar a garantia de depósitos dos bancos ao diminuírem a alavancagem (montante de cobertura dos empréstimos feitos, em relação ao volume de depósitos e patrimônio). O que poderia ser um pequeno passo no sentido contrário da desregulamentação financeira impulsionada no inicio dos anos 80, tem, com efeito, direto a aceleração na privatização da essência dos bancos estatais, já que não diferencia a característica dos bancos privados em relação aos estatais. O chamado PROER 2, com a liberação de R$ 12 bilhões do tesouro, inicialmente para o BB, CEF, BNB, faz parte destas exigências. Por trás disso está também a futura anistia de dívidas de grandes empresários, não podendo descartar iniciativa de privatização explicitas ou disfarçadas dessas instituições, pois o saneamento de estatais sempre foi o primeiro passo para sua privatização. Os bancos estatais serão prejudicados com esses novos parâmetros, já que realizam investimentos sociais (habitação, agricultura, infraestrutura, etc) e por esse motivo não operam na mesma lógica de rentabilidade e prazos de amortizações dos bancos privados. Quando a Caixa Econômica Federal financia a compra de um apartamento em 20 anos para pagar, assume investimentos de longo prazo, coisa que o setor privado não pratica. Nesse longo prazo muitas coisas podem ocorrer (mudanças na política monetária, desemprego, redução salarial). A medida que são forçados a adotar os novos procedimentos, estarão se distanciando daquela finalidade e risco. No Brasil, as exigências ficaram ainda mais rígidas que a do acordo, e a alavancagem máxima de 12,5 foi reduzida para apenas nove vezes o seu capital, com uma exigência de patrimônio líquido ajustado (PLA) em torno de 11% do total dos ativos. O banco do Brasil para se adequar àquelas exigências transferiria para o tesouro cerca de R$ 20 bilhões, sendo deste total R$ 5,2 bilhões em créditos rurais, de empréstimos acima de R$ 200 mil e R$7,2 bilhões referentes a títulos da dívida externa renegociada em 1994, que seriam transformados em dívida pública (FSP 27.06.01). O Banco do Brasil e Caixa irão se enquadrar nas regras da Basiléia para serem mais competitivos junto aos bancos privados, significando um redirecionamento mais ativo para a intermediação da dívida pública. Os dispêndios com o saneamento dos bancos estatais já consumiram R$ 60 bilhões, sendo R$ 52 bilhões com os estaduais e R$ 6 bilhões para cobrir parte da anistia da dívida dos ruralistas em 1996 pelo BB. A privatização dos bancos estaduais serviu, até agora, apenas para queimar arquivos da corrupção praticada por políticos e empresários próximos do poder, constituindo-se em apenas mais uma etapa de anistia de dívidas, já que nada foi feito para investigar quem foram os beneficiados. Parte dos problemas da CEF vem do fato desta ter assumido as chamadas partes podres dos bancos privados, durante o PROER, quando as carteiras de dívidas do sistema financeiro da habitação foram a ela repassadas. A criação da empresa gestora de ativos, pela CEF para administrar, R$ 27 bilhões de empréstimos habitacionais e saneamento, faz parte do ajuste patrimonial e pressupõe um plano de demissão voluntária e a contratação de trabalhadores flexibilizados. O processo de privatização mais claro pode ocorrer se o tesouro nacional não mais adquirir ações do BB, já que hoje 90% destas pertencem ao tesouro, ao BNDES e a PREVI. Isto abriria o caminho para a privatização disfarçada, pois irão recorrer às bolsas para negociarem seus papéis. Por sua vez, isso implicará na exigência deste banco se preparar para atender aos critérios de rentabilidade privada. Os rombos dos bancos estatais não podem ser atribuídos somente aos desvios vindos da corrupção, inerentes a gestão privada de seus empréstimos para atender aos grupos políticos de sustentação dos vários governos que tivemos. A gestão da política econômica e as demandas de financiamento das contas públicas e do setor externo, nos vários momentos de incertezas nacional e internacional, quando os agentes privados se negaram a financiar, são outras fontes de desajustes destas instituições. Já em 1976, quando o crédito externo encurtou e as taxas de juros externas subiram, foram esses bancos e as empresas estatais que se responsabilizaram pela captação de empréstimos externos para evitarem maiores constrangimentos externos. Nesse caso, o ônus foi muito grande e a seguir repassados para o tesouro. Em outros momentos, esses bancos foram usados para comprar títulos da dívida externa, como em 1995 durante a introdução do Real. Outra forma vem das conseqüências dos efeitos da própria política monetária, especialmente durante o plano real, quando os juros se elevaram para manter a estabilidade da moeda. Essa elevação das taxas possibilitou que Estados, municípios e União tivessem suas dívidas também elevadas. A caixa econômica, por ser a principal responsável pela gestão da política habitacional, também foi contaminada, a medida que os juros elevados exigiam uma maior remuneração para a poupança para atrair recursos. Isto por sua vez encarecia os recursos para investimentos no setor. O resultado desse processo é que o saldo devedor dos mutuários se elevou, implicando numa maior inadimplência e maior passivo a ser assumido pelo tesouro, que é o principal acionista. Segundo estudo sobre a evolução do crédito no Brasil de 1994 a 1999, de Ricardo Soares, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA, o maior problema do novo acordo, vem do fato que os ativos recebem ponderações, nas quais as aplicações em títulos públicos são consideradas isentas de riscos, enquanto créditos e financiamentos chegam a ter ponderação de 100%, levando as instituições financeiras a ampliarem suas aplicações nesses títulos públicos em detrimento dos empréstimos ao setor privado, resultando na redução do crédito para pessoa jurídica (Estadão 24 07 01). Essas novas exigências do acordo, privilegiando os títulos públicos, abrem caminho para que os bancos estatais, que restaram, caminhem no mesmo rumo que o banco de la Nacion argentino, que passou a ser um dos principais compradores dos títulos públicos, num momento em que os banqueiros privados não aceitam comprar.

Assim, repetem o papel já desempenhado pelos bancos estatais. No acelerar da crise temos um novo paradoxo, quando o Estado se endivida com outro braço do Estado (bancos estatais), fato que no início do plano Real diziam combater. Por isso temos que reestatizar os bancos privatizados, mas ao mesmo tempo construir uma correlação de forças que represente os interesses dos trabalhadores, porque banco estatal não pode ser gerido pela burguesia. Antes disso, temos que quebrar o sigilo bancário, telefônico e fiscal de todos aqueles que participaram das várias gestões, juntamente com os beneficiários dos empréstimos.

Diretrizes orçamentárias da USP, um debate necessário

http://www.adusp.org.br/noticias/Informativo/128/inf12807.html
28/10/02
Diretrizes orçamentárias da USP, um debate necessário

No dia 17/12 serão votadas as diretrizes orçamentárias da USP para 2003. Como subsídio para as discussões do tema, publicamos abaixo a "Proposta de Debate sobre as Diretrizes Orçamentárias da USP", aprovada no VII Congresso dos Estudantes da USP, e apresentada por José Menezes Gomes, representante discente da pós-graduação na Comissão de Orçamento e Patrimônio (COP), na última reunião deste órgão, em 14/10.

O ponto central da proposta é a solicitação de que seja retirado das diretrizes orçamentárias de 2003 o item 3.1.2, "Adicional de Desempenho Acadêmico", que define critérios para a destinação de uma parcela de 20% da verba destinada a "Outros Custeios e Investimentos".

Esta última corresponde a 15% do orçamento total da USP (em números redondos, cerca de R$ 300 milhões, de um total de R$ 2 bilhões). Assim, o item 3.1.2 representa 3% do orçamento, o equivalente portanto a cerca de R$ 60 milhões.

As diretrizes atuais beneficiam as unidades que oferecem maior número de cursos pagos, contempladas com maiores recursos. A COP rejeitou a proposta, alegando considerar "mais adequada a diretriz adotada no exercício anterior", como informa na "Proposta Preliminar" aprovada em 14/10.

"Quando se discute o orçamento da USP estamos, é claro, discutindo uma concepção de universidade. Isso fica bem claro quando analisamos as diretrizes orçamentárias: nelas está a concepção de uma universidade voltada para o mercado, tendo nas fundações privadas e nos cursos pagos as vantagens para recebimento de verbas de parte do item ‘outros custeios e investimentos’. O caráter produtivista na determinação de parte desta verba é bem evidente", afirma Menezes.

A proposta

"Na distribuição de recursos no orçamento da USP temos 85% para pessoal e encargos e 15% para outros custeios e investimentos. Nossa intervenção neste momento refere-se somente aos 15% de outros custeios e investimentos. Os recursos de outros investimentos são alocados por meio de dotações específicas nos orçamento de cada Unidade e dotações de caráter geral.

As alocações específicas incluem a Dotação Básica complementada pelos adicionais de Desempenho Acadêmico, Manutenção predial, etc. A Dotação Básica (3.1) corresponde à parcela principal da rubrica Outros Custeios e Investimentos para cada Unidade. Ela é distribuída às Unidades com base nas atividades de ensino (por que não inclui pesquisa e extensão?) de graduação e de pós-graduação, ponderadas, respectivamente, 60% e 40%.

Já o item Adicional de Desempenho Acadêmico (3.1.2) corresponde a 20% da Dotação Básica Global que é distribuído entre as Unidades, adotando-se os seguintes indicadores e fatores de ponderação:

1. Em relação aos cursos de graduação – Fator de participação relativa = 15
2. Em relação aos Cursos de Pós-graduação – Fator de participação relativa = 20 , Fator de participação = 20
3. Produção científica da Unidade por Docente – Fator de participação = 10
4. Avaliação externa, representada pela participação relativa da Unidade nas concessões de agências financiadoras externas à USP – Fator de participação relativa = 10
5. Atividades de Extensão Universitária, representadas pela relação entre o número de cursos de Especialização, com peso 3; de Aperfeiçoamento, com peso 2; e de Difusão, Cultura e outros cursos de Extensão, com peso 1, ministrados por docentes da Unidade e o número de docentes da Unidade – Fator de participação relativa = 15 (no ano de 2001 este fator era 10 e foi elevado para 15, justamente porque favorecia as unidades que mais atuam com os cursos pagos, mais próximas da fundações.)

Questionamento

Considerando que 20% da dotação básica global acabam sendo alocados de acordo com Desempenho acadêmico, sendo que os critérios desta avaliação estão em questionamento (vide as alterações aprovadas recentemente no CO);

Considerando que este tipo de alocação pode representar uma forma de punição a unidades que apresentam características e problemas específicos, que longe de se buscar a solução, cria-se um círculo vicioso, onde a Unidade com menor avaliação receberá menos recursos, o que num momento seguinte poderá ampliar o problema existente (a FFLCH, por exemplo, considerando o problema enfrentado com a falta de professores, acaba requerendo tempo mais longo para a conclusão na graduação e pós-graduação, que, por sua vez, resulta em prejuízo no momento seguinte de liberação);

Considerando que entre os fatores de ponderação, as atividades de Extensão Universitária (item E) não só entram no cálculo como têm fator de ponderação relativa igual a 15, este fato privilegia Unidades que tiveram mais destaque na priorização desta finalidade e acaba por destinar mais recursos para as unidades que menos atuaram no ensino (é bom lembrar que extensão universitária na USP, hoje, é marcada pela realização de inúmeros cursos pagos, motivos de grandes polêmicas, inclusive decisão de Conselho de Pós-graduação de suspendê-los até que se estabeleça o que pós-graduação na USP);

Solicitamos nesta COP que seja retirado das diretrizes orçamentárias de 2003 o item 3.1.2, "Adicional de Desempenho Acadêmico", permitindo que estes 20% voltem para a Dotação Básica Global dentro dos critérios a ela inerente.

Esta solicitação se faz no entendimento de que o item 3.1.2 caracteriza-se atualmente como dotação por tarefa, parecido ao aplicado no governo Roseana Sarney, no Maranhão, onde as escolas públicas recebem verbas de acordo com princípios semelhantes aos praticadas na USP.

Tal princípio também está presente na remuneração por tarefa existente nas Universidades Federais."

Eleições 2002: Efeito Orloff ou saída operária camponesa?

JOSÉ MENEZES GOMES Anterior | Índice | Próxima

Eleições 2002: Efeito Orloff ou saída operária camponesa?
http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=59161&edicao=10003&anterior=1
O pacote anunciado por Domingo Cavallo, com a desvalorização disfarçada de 8% do peso e aprovação pelo congresso argentino da incorporação do Euro como referência para do Peso, além do dólar, marca o futuro fim da última âncora cambial dos países subdesenvolvidos. Isto ocorre após a renegociação de US$ 29,5 bilhões da dívida externa pública e uma recessão de mais de três anos.

No Brasil, impulsionado por outros motivos, o Dólar chegou a R$ 2,50, culminando não só com a elevação dos juros em 1,5% chegando a 18% ao ano, além de uma nova ida ao FMI, quando a anterior já estava se findando. Foram mais de US$ 10 bilhões destinados a evitar a crescente desvalorização, que no ano já tinha chegado a quase 30%. Isto, de certa forma, marca os limites do câmbio flutuante e retorna a vinculação entre a política monetária e o câmbio, que marcou a época da âncora. Lá temos a crise da âncora e aqui a crise do câmbio flutuante.

Se a queda da taxa de juros nos EUA e na Alemanha, no inicio dos anos 90 permitiu, entre os outros motivos, a introdução desses modelos pelas economias subdesenvolvidas, no momento atual temos uma nova etapa de queda acentuada nos juros básicos americanos, chegando a 3,75% ao ano, onde a vulnerabilidade externa, a crise energética e o chamado “risco país” (risco de não pagamento das dívidas), acabaram por contrapor o efeito da queda de juros nos EUA. Com a aceleração da crise capitalista e da crise financeira do Estados, especialmente os periféricos, os efeitos da queda dos juros foram diferentes. Se a economia brasileira tinha se recuperado relativamente no ano 2000, com taxa de crescimento de 4% e prometia o mesmo patamar para esse ano, o cenário que resultou está mais para recessão do que para retomada.

Na política interna surgiu nova determinante, não só pelos motivos acima, mas também por mais uma rodada de escândalos, onde tivemos a renúncia, para evitar a cassação de dois senadores e ameaça de investigação do Presidente do senado Jader Barbalho, no desvio de verba do Banpará. Estes fatos tendem a minimizar as possibilidades de eficácia eleitoral de FHC e do seu grupo na próxima eleição.

Na Argentina, temos a expansão do movimento de fechamento de estradas, greves gerais, vários escândalos, além da prisão domiciliar do ex-presidente Menem por envolvimento na venda ilegal de armas. Este é melancólico fim das alianças surgidas pelo continente, que deram sustentação política para a implementação das políticas do FMI e BIRD: denúncias, escândalos, assassinatos, etc). É também, início da crise política, tal como ocorreu no México, Argentina, Peru, Equador. O grande problema é saber o que vem a seguir.

Lá, já tivemos o início de um ciclo político, no continente, antes existente na Europa, com a eleição de Fernando de La Rua. Este ciclo é marcado, inicialmente pela eleição da direita, que privatiza e retira direitos dos trabalhadores, produzindo um desgaste político que em seguida permite a chegada da centro esquerda ao governo. Essa, por sua vez, dá continuidade e às vezes aprofunda as reformas, resultando em desgaste político junto aos trabalhadores, permitindo em seguida o retorno da direita clássica ao poder. Neste intervalo, a direita propriamente, terceiriza junto a centro esquerda a tarefa de manter suas políticas.

No Brasil, com o grande desgaste político do governo, a candidatura de Luis Inácio Lula da Silva, está em primeiro lugar disparado nas pesquisas.

Se num primeiro momento, poderia representar uma boa perspectiva aos trabalhadores, a medida que começa o debate sobre o programa de governo a ser adotado as preocupações também se elevam, pois entre os pontos centrais do programa estão. A manutenção da CPMF e uma possível independência do Banco Central, numa tentativa de busca de credibilidade juntos aos grandes banqueiros e os organismos financeiros internacionais (FMI e BIRD).

O editorial do jornal Folha de São Paulo, com título Oposição à Argentina de 12 06 01, já indicava um alinhamento entre PPS e PT a um gesto de boa vontade da oposição de centro esquerda direcionado a um certo consenso de mercado, que reduziria a possibilidade do eleitor poder optar entre projetos diferentes, já que tanto direita como esquerda estariam dentro dos pressupostos ortodoxos.

Segundo o jornal “o risco não é o Brasil aproximar-se do Reino Unido, onde se tornou mínima diferença entre trabalhismo e conservadorismo. O risco é da vida partidária aqui sofrer de mal semelhante ao que padece a da Argentina, onde já não se vê força política capaz de liderar a saída da crise provocada por um modelo de superdependência de capitais estrangeiros. Lá a oposição ao menemismo subiu ao poder. Mas ao aderir à tirania do mercado, tornou-se idêntica às forças que conduziram à crise”. O que o jornal não tocou foi na raiz do problema: a dívida externa e interna.

O endividamento externo e interno retomou a patamares maiores que nos anos 80, mas na atualidade é o principal ingrediente desta “submissão” de governos que se propõem apenas administrar a crise capitalista, ao contrário de impulsionarem políticas de transição visando a superação do capitalismo, justamente no momento de agudização de sua crise. A renegociação das dívidas, não resolve, pois a Argentina acabou de renegociar quase US$ 30 bilhões e em nada resolveu seus problemas econômicos e sociais, apenas jogou para frente um problema que poderia estourar agora.

A independência do Banco Central proposta pelo PT, que significaria manter Armínio Fraga, pode ser a medida de “choque de credibilidade” aos banqueiros, mas terá significado parecido ao do governo de la Rua, que reconduziu Domingos Cavallo ao ministério da economia com superpoderes. Isto representaria um verdadeiro golpe de Estado, pois quem iria definir o eixo da política monetária seria justamente alguém que se quer foi eleito, ou seja, quem mandaria é quem não foi eleito pela população, mas escolhido pela comunidade financeira, como garantia dos compromissos com o pagamento das dívidas. Esse fenômeno é a síntese das contradições vindas políticas exigidas pelo banco mundial e o FMI para garantirem a “estabilização monetária”. O apagão é a revelação do parasitismo da iniciativa privada e das limitações dos investimentos estatais e o redirecionamento das receitas governamentais, para pagamento de juros das dívidas. É, portanto, a explicitação do equivoco do banco mundial, que afirmava que o Estado deveria se afastar da atividade produtiva e dar lugar a iniciativa privada.

Com o câmbio flutuante e a desvalorização do Real, tivemos uma fonte de prejuízo, quando da remessa de lucro às matrizes, uma elevação da dívida das empresas que deviam em dólar e o encarecimento de matérias primas, sem representar um aumento das exportações.

É necessário romper com esse ciclo vicioso de poder. Para tanto, é

necessário colocar como centro debate a elaboração de um programa, pelos trabalhadores, que tenha como eixo o não pagamento das dívidas externa e interna e o compromisso de pagamento da dívida social, pois o choque de credibilidade tem que ser para os trabalhadores e não para os banqueiros. Ao contrário de continuar a cobrar a CPMF para ter mais R$ 18 bilhões, bastava não pagar as dívidas que teriam muito mais dinheiro, pois o destino da CPMF é justamente para pagar os juros. Alegar que não podemos romper com o capital estrangeiro porque ele é importante para o desenvolvimento é falso.

O que temos nos últimos anos é exatamente uma inversão do fluxo de capitais, onde cada vez mais mandamos mais dinheiro para o exterior do que recebemos. Além do mais, o capital externo quando vem é para ser aplicado na aquisição de estatais ou para investir nos títulos da dívida pública.



* JOÃO MENEZES GOMES é professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e doutorando pela USP.

E-mail: menezesgomes@uol.com.br

Dinâmica da Economia Mundial Contemporânea

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Dinâmica da Economia Mundial Contemporânea
ISBN 85-7372-838-8
Economia - JS 3267
Formato 14 x 21 cm - 212 páginas
1ª Edição - Ano 2003
Dinâmica da Economia Mundial Contemporânea

A crise do mercado mundial encontra sua manifestação na saturação do próprio mercado, na inatividade do capital, na não-venda das mercadorias e na progressiva queda da taxa de lucro. O capital nasce para auto-valorizar-se, para criar mais-valia e, portanto, para obter lucros: face a uma excepcional dificuldade (limite do mercado), a produção como um todo entra em crise
(Osvaldo Coggiola e Francesco Schettino)

O General Dwight D. Eisenhower, em seu discurso de despedida para a nação como Presidente, lembrou seus compatriotas que os EUA emergiram dos conflitos nos quais estiveram envolvidos como a nação mais forte, mais influente e mais produtiva no mundo. Daí em diante, o poderio militar seria um elemento vital na manutenção da paz: Nossas armas devem ser poderosas, prontas para ação instantânea, de tal sorte que nenhum agressor potencial possa ser tentado a arriscar sua própria destruição. E assim foi feito.
(Edson Emanuel Simões, Eduardo B. F. Perillo e Jair Diniz Miguel)

Os olhos do mundo agora estão sobre a América – disse Zoellick, representante americano para o comércio exterior, na IIE, compreendendo ele também Estados Unidos por América. Mas qual é a opinião dos especialistas a propósito do colapso dos acordos de Bretton Woods? Não sabendo nem mesmo que coisa possa querer dizer crise de superprodução de longo prazo, ainda não resolvida, não relacionam 1970 com aquela crise e então vêem somente os efeitos : o curso dos câmbios semi-fixos de Bretton Woods não se adaptou ao sistema de mercados abertos dos capitais. Mas a causa?
(Gianfranco Pala)

As políticas de estabilização na América Latina, nos anos 90, resultaram da grande interferência dos EUA nos rumos dessas economias, na tentativa de contornar as contradições próprias do capitalismo na sua fase monopolista atual, tendo como eixo a busca do equilíbrio fiscal e a redução do tamanho do Estado.
(José Menezes Gomes)
Osvaldo Coggiola (ORG.)

Departamento de História (FFLCH) da USP
Programa de Pós-Graduação em História Econômica 2002